Artigo dominical

O velho Matias
Dom Pedro José Conti, Bispo de Macapá

Lá onde ele morava, todos consideravam o velho Matias um homem piedoso e justo porque observava escrupulosamente as prescrições da Lei. Na véspera de um sábado, ele estava voltando da roça carregando um feixe de lenha nos ombros. Improvisamente, à beira da estrada, encontrou um mendigo coberto de chagas que o suplicou de ajudá-lo com estas palavras:

– Não me deixes morrer aqui pelo caminho. Peço-te, me ajude!

Matias pensou consigo mesmo:

– Coitado de mim. O que devo fazer? Se socorrer este infeliz preciso largar a lenha que é o único sustento para a minha família. Se decidir abandoná-lo, me tornarei culpado de uma morte cruel. No primeiro caso, também, se eu fosse voltar para recuperar a lenha, seria tarde demais: o sol já teria se posto e serei obrigado a violar o sábado. Neste contraste de pensamento prevaleceu a piedade. O homem levou o mendigo até a vila e lhe arrumou uma hospedagem. Depois voltou para pegar o seu feixe de lenha. Quando chegou à cidade, ao pôr do sol, alguns murmuraram:

– Então é este o homem tão celebrado como piedoso e justo. Ele está cuidando dos seus negócios em dia de sábado! Naquele momento, o sol, que estava quase morrendo no horizonte, voltou atrás, iluminando como se fosse pleno dia o caminho daquele homem caridoso. E os murmuradores se calaram, tomados por um medo repentino.

Chegamos ao último domingo do ano litúrgico e celebramos a Festa de Cristo Rei. No final de toda atividade, torna-se necessário fazer um balanço e, para isso, precisa ter alguns critérios. Estes, por sua vez, dependem da finalidade do empreendimento. Se, por exemplo, a firma existe para lucrar, a avaliação da mesma será a respeito dos ganhos alcançados. Ninguém consegue manter, por muito tempo, uma atividade constantemente em perda. O desastre final, a falência, estaria garantido. Pode ser que a lógica econômica tenha pouco a ver com a nossa vida, mas ajuda a entender, também porque ter contas para pagar e dívidas para honrar, faz parte do cotidiano de muitas famílias. Por isso, não faz mal, mais uma vez, perguntarmo-nos se o balanço do amor da nossa vida é positivo ou está amplamente no vermelho. Nesse caso, temos uma dívida de caridade. Talvez pelejamos muito para ter bens, vantagens, afetos e atenções para nós, mas doamos muito pouco ou nada para os outros.

Jesus, com a parábola do julgamento final, quer nos lembrar as inúmeras ocasiões que temos ao longo da vida para construir fraternidade e misericórdia. As ações apresentadas são muito concretas. Nada de teoria ou de imaginação. Quem está com fome pede comida. Quem está sem nada, migrante, longe do seu país, pede uma casa para morar. Quem está com frio precisa de agasalho para se vestir. Quem está doente precisa de assistência médica, de hospital, de remédios, de carinho e compreensão. Quem está preso precisa de atenção, educação, perspectivas reais de uma nova vida. Discursos e promessas não resolvem. Precisa agir, na maioria das vezes, sem delongas, burocracias e adiamentos. Todos esses sofredores e sofredoras não são frios números de estatísticas ou matéria de noticiários, são pessoas, homens, mulheres, crianças, idosos, desconhecidos muitas vezes, mas que, por alguma circunstância, cruzam o nosso caminho. Podemos fingir que não existem? Podemos nos consolar sabendo que agora aumentou o número daqueles que têm maior poder de compra e por isso gastam mais, comem mais e viajam mais? Será que os pobres se tornaram invisíveis? Ou são os nossos olhos que ficaram cegos na frente da miséria, das lágrimas e das necessidades alheias? Afinal, como estão as contas da nossa religiosidade: ficamos somente na oração ou praticamos também as obras de misericórdia?

O extraordinário da parábola é que o próprio Jesus se identifica com os sofredores: – Foi a mim que o fizestes! – irá dizer aos generosos. Cada gesto de amor é uma luz para a nossa vida e para a vida de tantos que só sabem murmurar e criticar, mas nada fazem. Ao menos nós, os cristãos, saibamos escolher sempre o amor, para não ficar envergonhados no dia da verdade.

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