Artigo dominical

Quo vadis?
Dom Pedro José Conti, Bispo de Macapá

“Senhor, aonde vai? ” As palavras originais são em latim. Esta é a pergunta que constitui o título de um famoso romance de Henryk Sienkiewicz, escritor polonês. A obra foi escrita entre os anos 1894 e 1896 e publicada, em capítulos, num jornal da Cracóvia. O mesmo escrito também deu origem ao filme homônimo. A história que o romance desenvolve acontece na antiga Roma, no tempo das perseguições contra os cristãos sob o comando cruel do imperador Nero. Foi nessa época que, segundo a tradição cristã, foram martirizados São Pedro e São Paulo. Entre outras tramas, que se entrelaçam ao longo da obra, como em qualquer romance, está a situação pessoal do apóstolo Pedro.

Devido às perseguições, alguns cristãos começam a desistir; outros fogem para se esconder. Pedro fica com medo. Para salvar a própria vida, é aconselhado, pelos outros cristãos, a deixar Roma. Assim, junto com o jovem Nazário, o apóstolo decide sair da Cidade Eterna, mas no caminho acontece um fato extraordinário. Ele vê uma grande luz e no meio dela o próprio Cristo, que caminha em direção contrária à sua, ou seja, indo para a cidade. Pedro o reconhece e pergunta:

– Senhor, aonde vai?

E Jesus responde:

– Tu vais embora e eu vou me fazer crucificar outra vez!

Pedro estremece. A visão acaba. O companheiro Nazário não viu nem ouviu nada, mas Pedro agora não tem mais dúvida e nem medo: volta decididamente para Roma, pronto a enfrentar o martírio. Entendeu que devia ser fiel até o fim.

“Quo vadis?” é um romance, evidentemente. Tudo imaginário, mas bem interessante e sempre atual. Os tempos mudaram, mas perseguições, ameaças, zombarias e críticas fazem parte da vida de quem continua a missão de Pedro. Hoje, o papa se chama Francisco e os olhos do mundo inteiro seguem a espiá-lo e nem sempre com boas intenções. Todo gesto ou palavra que se torna público, é avaliado e, depois, divulgado, criticado ou ignorado, passando pelo crivo dos interesses de quem viu e escutou. Muitas vezes as palavras do papa são pinçadas, tiradas do contexto e até distorcidas para fazer-lhe dizer o que não disse e nem queria dizer. No entanto, papa Francisco continua falando e fazendo gestos, sem dúvida, pensados e refletidos, mas sem a excessiva preocupação de agradar a todos.

Tudo isso pela simples razão que Pedro e os seus sucessores têm uma missão de fidelidade à humanidade atual, porque a ela são enviados e com ela devem dialogar, mas, antes, também com o próprio Jesus Cristo e a mensagem dele. Essa dupla “fidelidade” sempre será o desafio de todo pontificado. Cada papa é chamado a propor o único e perene evangelho de Jesus, porém com os olhos e o coração do homem contemporâneo.

A Boa Notícia do amor e da misericórdia de Deus, manifestada no Filho Jesus, não muda. Mudam as pessoas que, ao longo da história humana, cada vez mais complexa, sucedem-se na busca do bem e da verdade. Papa Francisco não tem receio de usar as palavras de sempre, como por exemplo: missão, conversão e misericórdia, mas quer nos ajudar a dar-lhes um sentido novo e atual. Quando fala de missão, insiste nas “novas fronteiras existenciais”, ou seja, aqueles ambientes e lugares que, talvez, não estejam tão longe geograficamente, mas são situações de pessoas que nós mesmos afastamos e excluímos. Jesus nos envia a esses irmãos e irmãs sofridos.

“Conversão da pastoral” significa imaginar caminhos e métodos novos para a evangelização, mas, sobretudo, a coragem de deixar formas envelhecidas de organização que não corresponde mais às urgências e aos clamores hodiernos. Por fim, quando papa Francisco fala sobre a “misericórdia” nos pede de sermos construtores de novos relacionamentos: de paz, de perdão, de reconciliação. Esta deve ser a resposta dos cristãos a uma sociedade onde dominam a indiferença, o individualismo e, muitas vezes, a violência. Na solenidade de São Pedro e São Paulo, peçamos que o Espírito Santo continue animando o papa Francisco, toda a Igreja católica e todas as pessoas de boa vontade.

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