“Se alguém te perguntar o quiseste dizer com um poema, pergunta-lhe o que Deus quis dizer com este mundo.” (Mario Quintana)
Categoria: Poesia
Verde pretérito
VERDE PRETÉRITO
Alcy Araújo
O sapo era verde
no lago verde.
O lodo era verde
no mar tão verde.
Eu era verde
ao poema verde.
A amada era verde
de olhos verdes.
O amor era verde
nos anos verdes.
A fonte era verde
a esperança era verde
e logo secou.
O sinal era verde
o carro era verde
a infância era verde
e se apagou.
(Do livro Autogeografia – 1965)
Participação – Poema de Alcy Araújo
Participação
Alcy Araújo Cavalcante (1924-1989)
Estou convosco.
Participo dos vossos anseios coletivos.
Vim unir meu grito de protesto
ao suor dos que suaram
nos campos e nas fábricas.
Aqui estou
para juntar minha boca
às vossas bocas no clamor pelo pão
sancionar com este rumor que vai crescendo
a petição de liberdade.
Estou convosco.
Para unir meu sangue ao sangue
dos que tombaram
na luta contra a fome e a injustiça
foram vilipendiados em sua glória
de mártires
de heróis.
Vim de longe
percorrendo desesperos.
Das docas agitadas de Hamburgo
das plantações de banana da Guatemala
dos seringais quentes do Haiti.
Vim do cais angustiado de Belém
dos poços de petróleo do Kuwait
das minas de salitre do Chile
Passei fome nos arrozais da China
nos canaviais de Cuba
entre as vacas sagradas da Índia
ouvindo música de jazz no Harlem.
Afundei nas geladas estepes russas.
morri ontem no Canal da Mancha
e hoje no de Suez.
Tombei nas margens do Reno
e nas areias do Saara
lutando pela vossa liberdade
pelo vosso direito de dizer
e de amar.
Estou convosco.
Voluntariamente aumento o efetivo
dos que não se conformam
em viver de joelhos
morrendo sufocando lágrimas
nas frentes de batalha
nas prisões
para dar à criança recém-parida
o riso negado aos vossos pais
o pão que falta em vossas mesas.
Meu filho
e o filho do meu filho
saberão que o meu poema não se omitiu
quando vossas vozes fenderem o silêncio
e ecoarem inutilmente nos ouvidos de Deus.
(Do livro Poemas do Homem do Cais, do poeta Alcy Araújo Cavalcante, meu pai, lançado no Rio de Janeiro em 1983)
Lirismo – Poema de Alcy Araújo
LIRISMO
Alcy Araújo (1924-1989)
Não,
eu não te darei um mal-me-quer.
Eu te darei
uma rosa de todo ano
e uma estrela
e uma lua branca
muito branca
um lírio
– porque os polichinelos ficaram inanimados
no bazar.
Depois
farei o poema do nosso primeiro beijo
recostarás tua cabeça no meu peito
e meus dedos compridos
acariciarão os teus cabelos
e Deus saberá
que nós estamos nos amando
porque haverá luz
e um grande silêncio
no pensamento das coisas.
Um poema de Salgado Maranhão
Aboio
Salgado Maranhão
Quem olha na minha cara
já sabe de onde eu vim
pela moldura do rosto
e a pele de amendoim
só não conhece os verões
que eu trago dentro de mim.
A vida desde pequeno
sempre cavei no meu chão
da raiz da planta ao fruto
fazendo calos na mão
eu aprendi matemática
descaroçando algodão.
Carcarás, aboios, lendas,
são minha história e destino
tudo que a vida me deu
é tudo que agora ensino
na quebrada do tambor
eu sou velho e sou menino.
Salada de frutas – Belíssimo texto poético de Luiz Jorge
Luiz Jorge Ferreira
Hoje é o Dia Internacional do Poeta
se o poeta fosse doutor?
– Uma saudade brilhando
na cravação de uma dor”
(Catulo da Paixão)
Se alguém te perguntar o quiseste dizer com um poema, pergunta-lhe o que Deus quis dizer com este mundo… (Mario Quintana)
O poeta é um fingidor.
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente.
(Fernando Pessoa)
Mas o que vou dizer da Poesia? O que vou dizer destas nuvens, deste céu? Olhar, olhar, olhá-las, olhá-lo, e nada mais. Compreenderás que um poeta não pode dizer nada da poesia. Isso fica para os críticos e professores. Mas nem tu, nem eu, nem poeta algum sabemos o que é a poesia. (Garcia Lorca)
O poeta é um jornalista da alma humana. (Affonso Romano de Sant’Anna)
Eu não forneço nenhuma regra para que uma pessoa se torne poeta e escreva versos. E, em geral, tais regras não existem. Chama-se poeta justamente o homem que cria estas regras poéticas. (Maiakovski)
Não sou alegre nem triste: sou poeta (Cecília Meireles)
Minha poesia é cheia de imperfeições. Se eu fosse crítico, apontaria muitos defeitos. Não vou apontar. Deixo para os outros. Minha obra é pública. (Carlos Drummond)
Dever do poeta é cantar com seu povo e dar ao homem o que é do homem: sonho e amor, luz e noite, razão e desvario. (Pablo Neruda)
Amapá 80 anos – O coreto da praça da matriz
1935 – Coreto da Praça da Matriz (hoje Veiga Cabral). No coreto se apresentavam as bandas de música da Guarda Territorial e do Mestre Oscar. Foi ouvindo estas bandas que interpretavam de forma magistral clássicos da música que muitos casais começaram a namorar e casaram, aí pertinho do coreto mesmo, na bicentenária igreja de São José.
O poeta Arthur Nery Marinho – que veio para o Amapá em 1946 – chegou a tocar neste coreto e relembra a velha praça nesta poesia publicada no livro “Sermão de Mágoa”, em 1993.
Praça Antiga
Arthur Nery Marinho
Velha praça, velha praça,
tenho saudade de ti.
Não da bonita que estás
mas da que eu conheci.
A praça do tio Joãozinho
e do seu Naftali:
o primeiro era Picanço
e o segundo Bemerguy.
A praça do João Arthur
também a praça do Abraão,
a praça que outrora foi
da cidade o coração.
A praça em que se jogava
todo dia o futebol,
esporte que só parava
quando já dormia o Sol.
Parece que isto foi ontem,
mas tanto tempo passou,
o que deixou de existir
minha saudade gravou.
Vejo a barraca da Santa,
vejo ali o ABC.
Há muito tempo não existem
mas a minha saudade os vê.
Da igreja o velho coreto
eu avisto, neste ensejo.
Do mestre Oscar vejo a banda
e lá na banda eu me vejo.
Eu considero um castigo
não apagar da lembrança
o que me foi alegria
e agora é desesperança.
Velha praça, velha praça,
renovaste e linda estás.
Não tens, porém, a poesia
do que ficou para trás.
Amor de jardim – Hendrew Lima
Amor de jardim
Hendrew Lima
Oh, linda flor
Quão bela desabrochou,
Meu jardim embelezou
Lembrei do meu amor
Que comparada a você,
É sinônimo de beleza, pureza e esplendor.
Embarcando na comparação
Posso ser de antemão
Um belo pássaro polinizador
E ser para sempre
O seu beija-flor!