Sabeis que é Natal

É Natal
Alcy Araújo Cavalcante
(1924-1989)

Sabeis que é Natal. Não é necessário que eu diga isto. O anúncio da renovação do milagre do nascimento de Jesus está nesta música que vem de longe, que desce do céu e flutua, em pianíssimo, em torno de nossa alma e toca de leve o coração dos homens. O milagre está, também, nesta luz que vem do alto e ilumina os espíritos, está no riso das crianças, na oração da rosa, na lágrima dos que sofrem, no canto dos pássaros, no sussurro da brisa, no murmúrio do rio e na saudade de minha mãe rezando.

Tudo é tão bonito que as lágrimas de dor e de saudade de infâncias inexistentes são poesia pura. O belo é tanto que não resisto à vontade vesperal de anunciar que é Natal, antes que a noite chegue, antes que seja oficiada a Missa do Galo, antes que dobrem os sinos na igreja comunicando a vinda do Messias.

Tudo é luz em torno do mundo. As trevas não prevalecerão quando cair a noite acendendo mistérios. As vozes dos anjos, o coral dos pastores de Israel, a lembrança dos Reis Magos estão presentes. Há perfume. Os turíbulos de Deus espargem incenso e mirra, porque é Natal no mundo e renasce a esperança no cumprimento da palavra dos profetas.

Mais uma vez é Natal!

Chegam as vozes da infância perdida nos caminhos e o coração enxuga saudades. Os sinos, à meia-noite, vão bimbalhar lágrimas distantes. Vêm de presépios inanimados e risos perdulários afogam angústias cotidianas. A dor se esconde por trás de mágoas indormidas e as horas se ocultam nos relógios, para que a poesia do Natal não passe e o musical minuto dure mais um segundo na eternidade deste dia.

É Natal!

Reza a minha alma de joelhos pelo menino sem brinquedos que perdi na minha pobreza de sempre.

É Natal!

Repetem meus arrependimentos nas estradas.

E uma alegria imensa absorve as tristezas que fabriquei no mundo. Um sentimento infinito de bondade apaga as dores que construí durante o meu ontem irreversível. Uma ternura imensa acende felicidades futuras, porque é Natal, neste sábado do mundo. Há um polichinelo no bazar. Pertence ao menininho doente que Jesus chamou para o seu reino. Uma boneca abandonada já não chama mamãe para a garota loura que um anjo levou pela mão naquela manhã de sol. Mas outros brinquedos coloridos fazem ciranda em torno das árvores de Natal e milhares de crianças são felizes nos lares cristãos de meu país sem coordenadas. Enquanto isto, Deus sorri, pleno de Amor, por trás da Eternidade.

(Do livro – ainda inédito – “Tempo de Ternura”)

  • Um texto de Alcy Araújo,de seu universo lírico,brota todo um cenário de seu cotidiano,refere-se a todo o clima de Natal.De inicio, este texto caracteriza se neste primeiros dois parágrafos,expressão da presença do divino nas coisas da cultura de seu tempo. Aos poucos,Alcy,vai referido muitas coisas,emoções,sentimentos,imagens de objetos do seu cotidiano,onde ele
    Expressa todo um estado de captações vivencial naqueles momentos,que permeados de atmosfera de suas antigas memorias,vai reconhecendo que o período de Natal,é um tempo divino
    Em que Deus renova todas as coisas…pelo poder de seu amor…ficando por de trás a eternidade. Para quem gosta de reflexão sobre o impacto de nossa memoria associado as belezas do Natal em nossa percepção vivencial
    De convivência com as dores e alegria desse tempo de espera do nascimento de Jesus,este texto de Alcy Araújo,o poeta do Cotidiano de Macapá,pode ser um bom estimulo para se ler e se encantar com o tempo de Natal.

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