A não violência – Dom Pedro Conti

A não violência
Dom Pedro José Conti, Bispo de Macapá

Como nos outros anos, para o 2017, no começo do ano civil, o Papa Francisco nos brinda com a sua mensagem para o Dia Mundial da Paz. Essa iniciativa chega ao número 50, porque começou com Papa Paulo VI em 1º de janeiro de 1967.

Desta vez, Papa Francisco nos convida a refletir e a agir para alcançar a paz, seguindo o “estilo” da NÃO VIOLÊNCIA. De fato, a pergunta que devemos nos fazer é elementar: é possível construir uma paz verdadeira e duradoura com meios violentos? Muitas vezes a própria guerra foi apresentada como uma solução necessária para alcançar a paz. Uma espécie de mal menor. Nada de mais falso e ilusório. Além da violência inadmissível de qualquer guerra, também já vimos que não existem “guerras relâmpagos”, resolutivas. Também porque não existem “guerras santas”. “ Só a paz é santa” nos lembra o Papa Francisco. Com efeito, cada vez mais a violência das guerras, com seus bombardeios e atrocidades, alastra-se no tempo. São milhões as vítimas, entre as populações civis, inocentes, que passam fome, são tomadas como reféns ou obrigadas a migrar para sobreviver. Todo dia assistimos a esse sofrimento desumano pelas imagens dos meios de comunicação. No entanto muitos ainda pensam que uma “luta” não violenta seja um sinal de fraqueza ou de submissão. Pessoas demais ainda acreditam no poder das armas.

Com sua mensagem, o Papa Francisco quer nos ajudar a desfazer esses equívocos, tão errados quanto contraditórios, com a própria essência da paz. Alguém pode objetar que a palavra “luta” também não combina com a paz.  A não violência é um meio de luta, sim, mas não para esmagar o “inimigo”. Tem como objetivo a conquista dos direitos, pessoais ou de povos inteiros, do respeito e da dignidade da vida individual e de todos, sem os privilégios que ainda separam os pobres dos ricos, os que detêm o poder – das armas, dos capitais ou das leis injustas – e quem possui somente a própria vida.  Não s&a tilde;o esses “poderes” que estão em jogo, mas os direitos vitais de cada um como a alimentação, a saúde, a educação, a segurança e a liberdade. Para conseguir tudo isso, é preciso encontrar recursos e, sobretudo, leis justas que sejam respeitadas e aplicadas. Não precisaria lutar tanto se, quem tem condição, entendesse que o direito à vida é de todos sem distinções. Infelizmente estamos, ainda, muito longe de viver uma fraternidade mais universal e mais justa. As “lutas” pelos direitos, chamados apropriadamente de humanos, porque dizem a respeito de cada pessoa, vêm de longe e não irão acabar tão cedo. Ainda é de pedra o nosso coração.

As lutas não violentas são, portanto, “lutas”, mas travadas com meios não violentos, porque visam alcançar dois grandes objetivos. O primeiro é, sem dúvida, a conquista dos direitos negados. O segundo objetivo é tão importante, se não mais que o primeiro, é aquele de chegar a convencer o “outro lado” – que está com o poder e as armas na mão –, que está errado a considerar-se no “direito” de pisar ou ignorar a dignidade do outro, impondo as suas leis, a sua cultura, o seu lucro. Se como todo mundo – ou quase – diz-se querer uma sociedade mais justa e fraterna, todos precisamos colaborar, cumprir o noss o esforço e as nossas obrigações, por amor à justiça e à verdade, não por obrigação ou recorrendo ao uso da violência de qualquer tipo. Uma consciência mais humana e menos egoísta deveria ser suficiente. Uma “lei” escrita no coração, para usar a linguagem dos profetas da Bíblia.

Essa última é a tarefa mais difícil do “estilo” não violento de construir a paz: convencer a consciência das pessoas, demais preocupadas com o próprio bem-estar individual, que a solidariedade, a partilha e a fraternidade são o caminho mais certo e seguro para uma paz real e feliz. Vivemos tempos nos quais se fala muito de sacrifícios e de menos gastos, mas o peso está caindo nas costas somente de uma maioria de pobres, desempregados e cada vez mais marginalizados. Pela história, porém, algumas “minorias” – os negros – ou algumas “maiorias” – os pobres de alguns países – conseguiram ter os seus direitos respeitados, a sua liberdade e independência garantidas. Criaram organizações, economias alternativas, lutaram, resistiram. Alguns foram mortos pela truculência dos poderosos. Mas valeu a pena. Talvez a “luta” não violenta nunca acabe, porque a violência e as agressões sempre irão parecer um caminho mais fácil até para se defender. Mas é o caminho da morte, não da vida, é o caminho das guerras, não da paz. “Asseguro – diz Papa Francisco – que a Igreja Católica acompanhará toda a tentativa de construir a paz inclusive através da não-violência ativa e criativa” (o itálico é meu). Afinal nos consideramos seguidores de Jesus Cristo, mas ainda bem pouco ativos e criativos em prol da paz.

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