Artigo – O que vem por aí?

O que vem por aí? Não sabemos, mas eduquemos para o futuro
Ronaldo Mota (*)

É bastante comum ouvirmos corretas reclamações dos menos jovens sobre a compulsiva e obsessiva ligação dos mais jovens com celular (geração heads down ou, em português, “cabeças baixas”). Ainda que pertinentes as observações, a tendência é que, ao invés dos mais jovens mudarem seus hábitos, talvez o mais provável é que os mais velhos se acostumem com os hábitos e parem de reclamar. É previsível também que o celular seja somente um prenúncio de algum novo dispositivo que ficará cada vez mais grudado ao corpo e, certamente, ativo o tempo todo.

As mudanças serão mais radicais do que possam parecer até aqui. Em todos os setores, sem exceção. Por exemplo, algo ainda embrionário e que será definitivo é a transformação nos ambientes de trabalho. O modelo atual tem resistido, com mudanças relativamente cosméticas até aqui. A flexibilidade em termos de trabalhar onde quiser e quando quiser, sempre sendo os trabalhadores aferidos pelos resultados obtidos e jamais pelos processos adotados, será a marca dos novos tempos. Da mesma forma, as profissões serão aquelas que existem hoje reconfiguradas e modificadas profundamente, à luz das novas tecnologias digitais, acompanhadas pelo surgimento de atividades e carreiras que sequer imaginamos atualmente.

A reinvenção do mundo do trabalho em curso e que será acelerada nos próximos tempos será muito mais intensa e rápida do que foi com a revolução industrial nos séculos passados. A própria noção de profissão, como a conhecemos hoje, será redefinida, sendo que a imensa maioria usará seus atributos e conhecimentos em áreas muito diversas, mudando de campos de atividades ao longo de suas vidas profissionais. Se um dia, corretamente, alguém se preocupou com o destino dos fabricantes de velas quando do surgimento das lâmpadas, ou nos dias atuais quando vemos os taxistas enfrentando o Uber e equivalentes, a amplitude dos conflitos similares atingirá a todos, sem exceção, inundando indistintamente todos as áreas da sociedade.

Mesmo iniciativas que, contemporaneamente, parecem definitivas, como, a título de ilustração, Facebook ou a emergência dos shoppings em detrimento das lojas de ruas, podem ter seus dias contados. O primeiro, a exemplo do Orkut, pode ter esgotamento rápido, bastando que alternativas mais atraentes promovam relacionamentos diferenciados de socialização e desloquem a atenção dos usuários, os quais se movem, quando o fazem, com rapidez e em massa. Os shoppings, como eles estão concebidos, dificilmente enfrentarão os espaços eletrônicos interativos e participativos de compras.

A perenidade de dados em geral, e os pessoais em especial, é algo muito sensível, o que já foi percebido, com sucesso, por aplicativos assemelhados ao Snapchat ou por vídeos de duração limitada. Igualmente, de forma rápida, terá pouco sentido possuir objetos, incluindo automóveis, se houver facilidade de acesso em condições mais favoráveis e com investimento de tempo muito menor. Os tempos disponíveis serão direcionados para atividades mais produtivas, seja no trabalho ou de lazer. Os aplicativos de serviços serão tão comuns como de aquisição de objetos e as oportunidades, seja de negócios ou de empregos, terão nestes campos terrenos incrivelmente férteis.

E a educação como fica? Embora não claro, é certo que como está não será. As metodologias educacionais em curso refletem valores e demandas de um passado que se afasta muito rapidamente. As pedagogias inovadoras ainda não ocuparam seus espaços, mesmo porque ainda é nebuloso o cenário à frente e aqueles que estão em postos de decisão tendem, assustados pelas possibilidades de mudanças, a reforçar mais ainda os antigos pressupostos.  Neste ponto, educadores, gestores educacionais, motoristas de taxi e nós todos em geral nos assemelhamos, demonstrando mais pontos em comum do que simplesmente compartilharmos o mesmo futuro que se aproxima.

*Ronaldo Mota é reitor da Universidade Estácio de Sá e Diretor Executivo de Educação a Distância da Estácio

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