Os vizinhos – Dom Pedro José Conti

Os vizinhos
Dom Pedro José Conti, Bispo de Macapá

 Conta Madre Teresa de Calcutá: “Certa noite, um senhor veio na nossa casa para pedir comida para uma família hindu com oito filhos. Peguei um pouco de arroz e logo fui para lá. Pelos rostos das crianças, vi que estavam com muita, muita fome. No entanto a mãe pegou o arroz, o dividiu em duas partes e saiu. Quando voltou perguntei a ela: ‘Onde foi? O que fez?’ A resposta foi de poucas palavras: ‘Eles também estavam com fome’. Eram os vizinhos da porta do lado, uma família muçulmana, e ela sabia que estavam com fome. Eu não fui buscar outro arroz naquela noite. Quis que experimentassem a alegria de doar. Não fiquei surpreendida que aquela mãe sentisse o desejo de doar. O que me surpreendeu foi que ela soubesse que eles também estavam com fome. Nós também sabemos? Temos tempo de saber? Temos tempo ao menos para sorrir a alguém?”

No terceiro domingo de Advento, encontramos um evangelho onde ecoa uma única pergunta feita por pessoas diferentes a João Batista: o que devemos fazer? As respostas mudam conforme os questionadores: as multidões, os cobradores de impostos e os soldados. No entanto também a resposta pode ser considerada uma só: aprender a partilhar comida e roupa com quem não tem, não abusar do próprio ofício, do poder ou da força, ser honestos nas cobranças e rigorosos na verdade. Um convite claro ao respeito à vida dos irmãos, praticando a solidariedade e a lisura. Quase uma antecipação do mandamento evangélico do amor; sem dúvida, um bom começo para acolher a novidade do Messias Salvador, que João Batista estava anunciando. Nesse sentido, é importante a resposta do próprio João a quem o indagava para saber se era ele mesmo o grande espe rado. “Não sou digno” diz o Precursor. Mais tarde, Jesus reconhecerá a missão profética do Batista e a sua grandeza entre os “nascidos de mulher” (Lc 7,24-28).

Voltamos à primeira pergunta que os diferentes grupos fazem a João Batista: “o que devemos fazer?” Nos versículos anteriores do evangelho, lidos domingo passado, o convite era para a conversão dos pecados. Com essa nova pergunta, fica claro que a verdadeira conversão não consiste em meras declarações ou num banho penitencial e purificador no Rio Jordão. Sem mudança de vida, de escolhas e atitudes, não há novidade nenhuma. Maquiagem exterior ou roupa nova, não transformam o nosso interior. Na prática, continuamos a pensar e agir como antes, presos em nossos preconceitos, desconfianças e medos. Por isso, uma conversão séria exige tempo, esforço e perseverança, mas também reconhece que, antes de tudo, é dom e ação do próprio Deus. O que cabe a nós é manifestar o desejo de mudanç a e aceitar as consequências. Essas podem ser o afastamento dos amigos anteriores, o desprezo de quem não entende as nossas novas escolhas, a perseguição de quem se considera prejudicado por não compactuarmos mais com planos e costumes antes tolerados, mas agora inaceitáveis para nós. Quem entra no caminho da conversão deve confiar mais nas consolações de Deus que nos aplausos dos homens. Para nós, cristãos, o “fazer” ou agir da nossa vida é norteado pelos princípios da “moral”, que dizem a respeito do que é entendido como bem ou como mal. Mas quem decide isso? E, sobretudo, na base de que? Existem normas universais válidas para todos e em qualquer lugar? Para muitos o bem e o mal, o certo e o errado são decididos pela maioria. Jovens e adultos justificam suas escolhas dizendo: – Todos fazem assim! Como se o número de quem age d aquela forma, e que sempre imaginamos muito grande, fosse suficiente para torná-la justa e boa. Um exemplo fácil, nos dias de hoje, são a vantagem e o lucro. Se eu ganho, o meu agir é bom. Talvez o seja para mim, mas eu não vivo isolado dos demais e sou sempre responsável pelas consequências, às vezes prejudiciais, para os outros. Para nós cristãos, continua valendo a “regra de ouro” do evangelho: “Tudo, portanto, quanto desejais que os outros vos façam, fazei-o, vós também a eles. Isto é a Lei e os Profetas” (Mt 7,12). Sem amor não há conversão. Nunca ligaremos para a fome dos vizinhos.                     

  • Todos os dias pelejamos com o próprio dia; o tempo que urge, não é mais o tempo que encontrávamos a todo tempo. Não se encontra o agasalho que possa acolher e nem dá esperança aos que vivem sem esperança. O pão; cada vez mais sem fermento; já não dá mais para se partilhar. O bom dia, a boa tarde a boa noite, se escondem às nossas costas, que nem sempre escapam de nossas bocas. O sino bate, mas o fiel está sempre ocupado a ouvir o toque do celular. Se Jesus vai nascer; ah, esqueci do seu presente espiritual, pois é cada vez mais caro; à medida que viro o filho pródigo e me afasto da casa do Pai. Jesus vai nascer”?”

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