Só um exemplo

Só um exemplo
Dom Pedro Conti, Bispo de Macapá

 O pequeno André, impressionado pelos noticiários da TV, pergunta:

– Pai, como é que começa uma guerra?

– Querido, as coisas andam mais ou menos assim: por exemplo, entre a Inglaterra e os Estados Unidos surge um forte dissídio sobre alguma questão grave… A mãe intervém:

– Não fale bobagem, Inglaterra e Estados Unidos nunca vão brigar!

– Sei – responde o pai – era só um exemplo.

– Assim você enche a cabeça do menino de besteiras – insiste a mãe.

– Mas, ao menos, eu lhe coloco algo na cabeça, você é o vazio absoluto!

– Você está ficando ridículo! – continua a mãe.

– Tudo bem, obrigado, já entendi – conclui o pequeno André.

Uma pequena história no dia em que as nossas famílias festejam os pais e encontramos um evangelho, de certa forma, surpreendente. Jesus nos diz que não veio trazer a paz, mas a divisão entre familiares. Ele vai lançar um fogo sobre a terra e gostaria que já estivesse aceso. Deve receber um batismo e está “ansioso até que isso se cumpra”. Vamos tentar esclarecer de qual fogo, de qual batismo e de qual paz Jesus está falando. Para a Bíblia, em geral, a “paz” é algo muito valioso. Podemos chegar a dizer que a paz é o conjunto de todos os bens, materiais e espirituais, prometidos por Deus. Na linguagem dos evangelhos “paz” e Reino de Deus coincidem. Nós cantamos na liturgia: “Onde reina o amor, Deus ali está”, ou seja, a presença do Senhor na caminhada do seu povo e na vida das pessoas que se amam é a maior alegria, é a plenitude da comunhão e da fraternidade. No entanto, essa “paz” é um bem que ainda deve ser alcançado, construído, esperado. Com a Ressurreição de Jesus, a sua vitória sobre o mal e a morte, o Reino da Vida e da Paz já começou, mas temos um longo caminho de conversão à nossa frente.

Por “fogo” podemos entender o próprio dom do Espírito Santo com sua luz e sua força, mas também a luz da verdade, a fogueira que queima toda violência, ódio e mentira. Por “batismo”, enfim, podemos entender – como o próprio Jesus fala em Mc 10,38-39 – o sofrimento e a morte de cruz. Podemos dizer que a paz, entendida no sentido grande da palavra e não como uma simples concordância ou uniformidade, é um bem que, para ser alcançado, precisa de muita luta contra os nossos interesses, orgulhos e ambições de poder individuais ou de grupos. A “paz”, como tudo o que é bom, duradouro, profundo e sério de verdade, exige renúncias, colaboração, partilha, solidariedade, gestos de perdão e reconciliação, fidelidade à palavra dada. De um lado, precisa-se do “fogo” de quem tem a coragem e o entusiasmo para mudar as coisas erradas e, do outro, a disposição para perseverar na busca e suportar os sofrimentos que vêm das traições e dos fracassos. Contudo a paz verdadeira é um bem tão grande que vale a pena qualquer esforço e sacrifício para alcançá-la.

Penso agora nas nossas famílias e no desejo que todos os pais têm de ver os seus filhos unidos, respeitando-se e ajudando-se. Toda família é diferente e é formada por pessoas diferentes, por isso, uma família unida é uma pequena oficina onde é possível ensaiar como poderia ser uma sociedade “fraterna” sem inimigos, divisões, ciúmes e invejas. Se Jesus fala de “divisão” é porque conhece o coração humano e sabe quanto é difícil acertar a convivência entre as pessoas, incluindo as nossas famílias. Jesus nos diz que não adianta fingirmos ou nos iludirmos que somos unidos quando, no fundo, descuidamo-nos dos laços que constroem a comunhão. Às vezes, é necessário reconhecer as divisões, para sentirmos saudade dos irmãos, das brincadeiras, das diversidades que nos enriquecem a todos. Feliz aquela família que nunca desiste de se reunir, superando as distâncias e as desavenças. Felizes aqueles pais que, vez por outra, podem ver os seus filhos e netos conversando sem agressões, confiando uns nos outros. Quem sabe que este dia seja hoje mesmo, Dia dos Pais – e das Mães – dia das famílias que sabem cuidar também das suas feridas, porque acreditam no Senhor, Rei da Paz. Já sabemos como começam as guerras. Vamos aprender a fazer florescer a paz!

Tire-o da minha frente 

Tire-o da minha frente 
Dom Pedro José Conti – Bispo de Macapá 
Um andarilho estava no escritório de um ricaço, pedindo esmola. O homem chamou a secretária e lhe disse:
– Vê este pobre infeliz? Observe como os dedos dos pés dele saltam para fora do sapato, como as suas calças estão esfiapadas, o casaco em frangalhos. Tenho certeza de que não se barbeia, não toma banho, não faz uma refeição decente há dias. Corta o meu coração ver gente nessa deplorável condição. Por isso: tire-o imediatamente da minha frente!
Neste 6º Domingo do Tempo Comum, escutaremos o evangelho das famosas “Bem-aventuranças” na versão de Lucas. As mais conhecidas são aquelas de Mateus e, portanto, convêm fazer algumas comparações lembrando, porém, mais uma vez, que cada autor sagrado reelaborou as tradições que recolheu antes de escrever conforme a situação da comunidade onde vivia. A primeira diferença é que no evangelho de Lucas as bem-aventuranças são somente quatro e estão acompanhadas por quatro “ais”. Jesus convida os pobres, os que têm  fome, os que choram e os perseguidos a se alegrar. Ao contrário, com os ais, alerta os ricos, os que têm  fartura, os que estão rindo e aqueles que são elogiados. Esses “ais” não são ameaças de castigo ou algo semelhante, são um convite claro a não construir a própria vida sobre os bens materiais, as alegrias e os aplausos passageiros.
 As “promessas” de Jesus lembram a todos, de um lado e do outro, que nenhuma situação, neste mundo, é para sempre. Os sofrimentos e as perseguições dos pequenos acabarão, mas terão um fim também as falsas seguranças dos ricos e famosos. Será uma simples viravolta? Uns ocuparão os lugares dos outros? Se fosse assim, afinal, nada mudaria. As bem-aventuranças – e os ais – apontam a uma nova realidade: o Reino de Deus que começa a acontecer. É o Reino, sabemos, da paz, da justiça e do amor. Esses são os novos valores que Jesus aponta. Talvez nunca exista um sistema social e político que cumpra perfeitamente esse projeto. No entanto, como cristãos, devemos acreditar que seja possível nos aproximarmos dele, corrigindo as injustiças e construindo a fraternidade. Entendemos que Jesus quer que todos tenham uma vida mais alegre e feliz,  não por causas das riquezas materiais, mas em razão da amizade e da solidariedade. Se os ricos e poderosos não estão dispostos a partilhar nada e se os pobres e sofredores só cobiçarem os mesmos bens, não mudará nada. Por isso, as bem-aventuras e os ais do evangelho de Lucas são um teste para ver em que e em quem acreditamos de verdade. Cabe um belo exame de consciência.
Nós todos, eu também, não posso negar, somos doutores no equilíbrio, ou seja, em evitar os extremos. Sabemos que não devemos desejar riquezas demais para não ficarmos escravos da nossa própria ganância. Mas também não desejamos ser odiados, expulsos, insultados e amaldiçoados “por causa do Filho do Homem” (Lc 6,22). Como nos alegrar com as críticas e as perseguições? Será que Jesus não exagerou um pouco? Talvez não sejamos profetas tão bons, mas não nos enxergamos como tão falsos assim. Não daria para amenizar as palavras de Jesus? De fato, é o que fazemos todos os dias para poder pedir perdão das nossas fraquezas e apaziguar a nossa consciência.
Lembrarei somente duas coisas. Primeiro deveríamos ouvir mais a voz, ou o grito, dos sofredores, dos que estão às margens desta sociedade. Se, de alguma forma, esse choro não nos incomoda mais, é sinal de que já estamos do lado de quem tem medo de perder o conforto,  as seguranças ou os privilégios que ainda sonhamos ou construímos ao longo da nossa vida. Desse jeito, escolhemos tirar os pobres da nossa frente. A segunda consideração é a respeito das críticas que vamos atrair. Os mártires “de todas as causas justas” não escolheram sê-lo, simplesmente decidiram praticar o que acreditavam, conscientes ou não do risco que corriam. Quem ficou mais “alegre”? Os carrascos e os zombadores ou os “profetas” do Reino? Cada um responda, sem esquecer, por favor, os pobres que estão à sua frente. Com eles, é o Senhor que estamos desprezando.

Só com os pedaços descartados

Só com os pedaços descartados
Dom Pedro José Conti  – Bispo de Macapá 
Durante a construção de uma catedral, o mestre de obra e os melhores artesãos trabalhavam em oficinas instaladas no interno do canteiro. Certo dia,  apresentou-se ao mestre um jovem desconhecido que também se dizia artesão. Pediu para trabalhar, mas o chefe lhe disse que não precisava, porque já havia pessoal suficiente e todo especializado. O jovem insistiu:
– Não quero trabalhar as pedras, somente gostaria de fazer um vitral, usando as peças descartadas pelos outros. Basta-me um cantinho, não lhe darei nenhuma despesa. O mestre lhe permitiu que usasse uma barraca velha e abandonada, perto do local onde descarregavam todos os materiais inúteis. Os meses passaram e o pessoal quase se esqueceu do jovem que trabalhava tranquilo em silêncio. Chegou, porém, o dia em que ele colocou para fora a sua obra secreta. Era um vitral de incrível esplendor. Ninguém antes tinha visto cores tão luminosas. Era o vitral mais encantador de todos os demais da nova catedral. Todos queriam saber onde ele tinha encontrado pedaços de vidro tão brilhantes. O jovem estrangeiro respondia:
– Encontrei os fragmentos espalhados por aí, onde trabalhavam os operários. Esse vitral é feito com os pedaços que foram descartados como inúteis.
Neste 4º Domingo do Tempo Comum, continuamos a leitura do capítulo 4 do evangelho de Lucas. Estamos ainda na sinagoga de Nazaré e Jesus acabou de ler o trecho do profeta Isaías. Quem fazia a leitura podia também fazer um breve comentário. As palavras de Jesus foram: “Hoje se cumpriu esta passagem da Escritura que acabastes de ouvir”. (Lc 4,21). Muita coragem e ousadia por parte dele, sem dúvida. Grande surpresa dos presentes, fascinados com as palavras que estavam ouvindo. O encanto, porém, durou pouco. Logo vieram os questionamentos e as pretensões. Reconheceram naquele homem o mesmo Jesus que ali, em Nazaré, tinha se criado. Na vila, viviam familiares e colegas dele. “Quem você acha que ele é?”. Com certeza, essa foi a pergunta que se espalhou rapidamente. Jesus respondeu assumindo a missão de “profeta”, ou seja, de alguém que fala em nome de Deus e, portanto, como todos os profetas do passado, o anúncio que trazia ecoava em Israel, mas também além das suas fronteiras históricas e geográficas. Não importa se esta mensagem será acolhida ou não. A “missão” do profeta é “falar” com a palavra e a vida.
A fama de Jesus, que havia se estabelecido em Cafarnaum, já se espalhara e, com certeza, despertava o ciúme e a inveja dos habitantes de Nazaré. Com mais propriedade, podemos dizer que a atividade de Jesus e a sua pregação “aos pobres” não correspondiam à imagem de “ungido” que circulava naquele momento. Esperavam um messias poderoso e triunfador, mas Jesus se apresentava como pobre, amigo dos pequenos e sofredores. Além de tudo, ele era fraco, porque iniciava a sua missão das periferias, bem longe dos centros do verdadeiro poder.  Em lugar de se questionar, de procurar entender mais e melhor o que estava acontecendo, os conterrâneos de Jesus, que afinal representam muitos outros que virão depois, decidiram expulsá-lo da cidade. Assim acontecerá ao longo de toda a vida de Jesus e, pelo jeito, acontecerá sempre. Como tinha dito Simeão na apresentação dele ao templo: “Este é destinado a ser… sinal de contradição” (Lc 2,34).
Não adianta esconder. Nos nossos dias, também, muitos consideram Jesus e a sua mensagem uma questão do passado, perdida há muito tempo. Talvez um discurso bonito, sentimental, ao qual recorrer numa hora difícil, mas que pouco ou nada traz de real e concreto. Fraternidade, compaixão, misericórdia, não enchem o bolso de ninguém. Todos nós, cristãos de ontem, de hoje e de amanhã, continuamos a ser desafiados a confiar ou não na Boa-Nova de Jesus. A tentação de jogar tudo fora é sempre muito grande. No entanto, os pobres e os pequenos, os descartados da sociedade, que, aqui e acolá, juntam as palavras de Jesus, constroem algo novo, brilhante, de cores nunca vistas. Agem no silêncio. Não divulgam, porque não disputam fama e sucesso com ninguém. Basta-lhes a luz do amor. A mesma luz de Jesus.

O mito e o castigo divino de Sodoma e Gomorra

O mito e o castigo divino de Sodoma e Gomorra
Alexsander Costa

O Homosapiens é a única espécie animal capaz de justificar, através de uma história, o funcionamento de vários acontecimentos da vida terrena.

A esta história chamamos de mito, que passou a existir a partir do momento em que o ser humano despertou conhecimento, poder de análise de experiências, e poder de justificar e conhecer determinados fatos da vida.

O mito tem o intuito de explicar algo que, até então, não tem explicação, algo que a experiência humana sente ou que tenta entender, seja do seu passado ou do seu futuro, do seu nascimento ou da sua morte, seja sobre a vida animal ou vegetal, das estações do ano, de seus costumes ou crenças.

A mitologia surgiu para auxiliar o ser humano a lidar com suas experiências, foi “criada” para ajudar nos momentos de dificuldades que encontramos em vida e assim vislumbrarmos novas realidades.

O mito é, também, uma narrativa etiológica, é diverso, pode nos amparar sobre a origem do mundo: cosmogonia. Sobre origem de Deuses: Teogonia. Sobre a morte ou origem dela: Escatologia. Sobre os fenômenos cósmicos na Cosmologia. Sobre histórias de heróis e muitos outros.

Em gênesis, livro bíblico, vemos um exemplo de cosmogonia, ou mito de criação, quando Deus, o grande criador, cria o mundo: “No principio Deus criou os céus e a terra” (cap. 1). Cria também, o primeiro humano a partir do “pó da terra” (cap. 2): Adão, que vivia no jardim do Edén. Ele ganhou vida para poder cultivar a terra no Paraíso.

Nos escritos Babilônicos, o Enuma Elish, há o relato da criação do universo através da união de deuses. Apsu (Deus das aguas doces) e Tiamat (deusa dos oceanos) que deram origem aos demais Deuses e

também aos seres humanos para que pudessem trabalhar no lugar dos Deuses enquanto estes descansavam.

Nestes escritos também encontramos mitos de criação, além de exemplos de mitos de heróis, como o que observamos na Epopeia de Gilgamesh, o primeiro herói que se tem registro na História. Além deste, a aventura de Utnapishtim no grande dilúvio babilônico, que rivaliza com o dilúvio bíblico protagonizado por Noé, aparece como castigo divino após a criação dos humanos e quando estes desagradaram os Deuses.

Como visto, os mitos possuem forte relação com religião, toda religião possui elemento mítico e ligações com ritos, no entanto a religião não deve ser pensada como o mito propriamente dito.

Na religião católica, em especial no gênesis (velho testamento), podemos observar vários mitos de criação e de heróis. No Cap. 10, o livro sagrado descreve como a terra pôde ser povoada a partir da descendência de Noé. Seus três filhos Sem, Cam e Jafé povoaram o planeta terra após o grande diluvio: desceram da arca, multiplicaram-se e espalharam-se pelas nações.

No cap. 13, versículo 13, há citação à cidade de Sodoma: uma cidade onde moravam homens “perversos e pecadores”, tal qual Gomorra, ambas ficavam próximas ao mar salgado (versículo 3, cap. 14).

Essa história ganha detalhes no capitulo 19: um castigo divino recai sobre as grandes cidades da época, onde o próprio Deus, o criador, lança sobre a Terra larvas de fogo. Mas, Abrãao, um dia antes ao conversar com Deus, tentou convence-lo a não destruir as cidades por conta de corações puros que ainda existiam lá. Ló, um destes homens bons, relutou em abandonar a cidade, ele ofereceu suas duas filhas para que os homens perversos da cidade não abusassem dos anjos enviados por Deus, e sim das moças virgens, em uma tentativa desesperada de salvar sua cidade e seu povo do fogo eterno.

O castigo divino desta vez não viria em forma de inundação porque Deus, ainda no cap. 9, havia aliançado com Noé que jamais a terra seria inundada novamente por sua vontade para castigar os seres humanos.

Os anjos, compadecidos da situação de Ló, pediram para ele e sua família deixarem a cidade em direção às colinas, mas Ló, suas duas filhas e sua esposa fugiram para se salvar do desastre até uma pequena

cidade vizinha. Foi então que o próprio Deus castigara os homens perversos daquele lugar com uma lançante de fogo e enxofre, destruindo as famosas cidades de Sodoma e Gomorra.

A história acima, explica sob a perspectiva judaico-cristã, através do velho testamento, como duas cidades da margem do mar morto, no vale do Sidím, onde hoje encontra-se o Iraque, foram tragadas pelo fogo em um evento catastrófico nos idos de 1700 a.c.

Hoje, com os recursos científicos e tecnológicos que dispomos, pesquisadores da Universidade Trinity Southwest, instituição cristã que fica em Albuquerque, Novo México (EUA), acreditam que o evento que dizimou as duas cidades e suas populações foi causado pela explosão de um meteorito que atingiu a atmosfera terrestre. A explosão desses corpos celestes a poucos metros da superfície ocasionou o que observamos nas escrituras sagradas, a “chuva de fogo e enxofre”.

Os cientistas usaram carbono 14 para datar o evento nos restos de construção que sobrou do sinistro, foram feitas escavações na região onde existiam as cidades, não apenas de Sodoma e Gomorra, mas a de el-Hammam, e todas as demais nas proximidades.

Uma grande onda do Mar Morto também é provável que tenha inundado a região após o fogo ter tomado conta do lugar, fazendo com que a localidade tenha ficado com solo pobre para a agricultura e inabitável pelos próximos 700 anos.

Os cientistas ainda hoje tentam desvendar mais mistérios da época, analisando os restos e fundações que restaram das construções do período.

Durante muito tempo se imaginou que as cidades nem tivessem existido e que o conto bíblico não passasse de uma história contada para justificar o castigo nas sociedades antigas e modernas.

Na antiguidade, a religião, através dos mitos era a forma de conhecimento que existia e que explicava todos os fenômenos, inclusive muitos que hoje já foram elucidados.

O mito de que “se você fizer algo errado será castigado” ainda perdura mesmo após o advento da ciência e mesmo tendo passado mais de 3 mil anos desde as primeiras escrituras. O medo de sofrer, de ser penalizado e expiado caminha lado a lado com a humanidade. Para muitos, a passagem terrena é um julgamento para a morada eterna, o paraíso ou para o inferno.

Independente dos recursos científicos ou da análise filosófica, o mito vai ser sempre uma constante na vida humana. Eventos nunca explicados e que talvez nunca sejam explicados pela impossibilidade da experiência vivenciada (como a morte, por exemplo) sempre irão contar com uma gama de hipóteses baseadas na ciência, na filosofia, nas religiões ou na mitologia.

O extraordinário poder da poesia na mente humana

O extraordinário poder da poesia na mente humana

*Thelma Miguel

Que a poesia e a boa música dão arrepios todo mundo já sabe, mas a ciência vem nos provar como isso acontece.

Com cerca de 4300 anos, a poesia é uma das primeiras manifestações literárias registradas. Provavelmente já existia anteriormente e sua transmissão era realizada de forma oral pelos povos. O fato é que, com certeza, ela afeta o cognitivo e a emoção das pessoas desde que se tem conhecimento da escrita. A partir desta constatação intuitiva, muitos trabalhos vêm sendo realizados na tentativa de provar como nosso cérebro é afetado pela poesia.

Estudo realizado na Alemanha demonstrou através de monitoramento de frequência cardíaca, movimentos faciais, eriçamento de pelos e ressonâncias magnéticas cerebrais durante a leitura de poemas, que áreas específicas do cérebro são ativadas com a poesia, algumas delas também estimuladas com a música. Contudo há uma diferença. A música nos arrebata de uma só vez.  A poesia nos leva a um relaxamento, provocando uma reação de prazer gradativo e atinge um clímax próximo ao desfecho do poema.

Na Universidade de Exeter foram avaliadas reações cerebrais de voluntários após a leitura de textos diversos: manuais de instrução, fragmentos de romances, sonetos, poemas em geral e até um poema favorito do avaliado. Descobriram que o cérebro processa de forma diversa o texto poético e a prosa, ativando áreas relacionadas ao processamento emocional, mas também áreas do cérebro associadas com a memória, como o córtex cingulado posterior e o lobo temporal médio, áreas que são despertadas quando estamos relaxados ou introspectivos. Ao estimular estas áreas associamos os poemas a nossas vivências e emoções profundas, gerando uma sensação de bem-estar.

O fato de algumas pessoas não serem afetadas tão profundamente pela poesia pode ser explicado por uma insuficiência de exposição durante a infância e adolescência associada a uma abordagem analítica e “engessada” na escola. Uma aproximação da realidade do leitor com a poesia, participação ativa em leituras, discussões, apresentações podem ser mais esclarecedoras e muito mais atrativas. Projetos educacionais com o propósito de espalhar poesia também devem sempre ser estimulados.

Livros de autoajuda e música são frequentemente associados a benefícios à saúde mental, mas, na verdade, um livro de poemas pode nos relaxar e emocionar ainda mais. Então, o que você está esperando para ler um bom livro de poemas hoje?

*Thelma Miguel é carioca, médica, mãe, avó e poeta, autora dos livros Sem Casca e O Silêncio e o Grito.

Aprender a gratuidade – Dom Pedro José Conti

Aprender a gratuidade 
Dom Pedro José Conti –
Bispo de Macapá

Chegamos ao domingo do Círio de Nossa Senhora de Nazaré. De novo, sem podermos nos manifestar como gostaríamos, numerosos e alegres, a nossa devoção a Maria, a humilde serva do Senhor, a “bendita entre as mulheres”, a “bem-aventurada” porque acreditou. Neste ano, colocamos Maria ao lado de São José. Eles, juntos com Jesus, constituem aquela que chamamos de “Sagrada Família”, exemplo para todos nós de oração, trabalho e fé. Qual segredo “a mais” podemos aprender com essa família tão especial?

Talvez nos ajude o evangelho deste domingo. Encontramos uma pessoa que procura Jesus e tem um grande desejo: “ganhar a vida eterna”. Algo maravilhoso se, com essas palavras, entendemos não tanto o conjunto de todos os bens possíveis e imagináveis, mas, nada menos, que o próprio Deus, sumo bem e plena felicidade para todos. Inicialmente, Jesus lembra àquele homem os mandamentos da Lei de Deus, ou seja, um caminho de confiança, obediência e respeito. Para aquela pessoa, porém, isso não tem nenhuma novidade: conhece os mandamentos e os pratica desde a juventude. O que lhe falta? – Só uma coisa – responde Jesus – vai, vende tudo o que tens e dá aos pobres, e terás um tesouro no céu. Depois vem e segue-me! (Mc 10,21). O evangelho continua dizendo que aquele homem “foi embora cheio de tristeza, porque era muito rico”. O comentário de Jesus vem em seguida: “Como é difícil para os ricos entrar no Reino de Deus!” (Mc 10,23). Pelo jeito, os bens materiais, tão cobiçados pela grande maioria dos seres humanos, são um obstáculo muito grande para fazer parte do Reino de Deus. No entanto o próprio Jesus aponta a saída: o que parece impossível para nós, somente com as nossas forças, é possível para Deus. Se nós o pedimos, com fé e confiança, ele mesmo, Deus Pai, nos dá a capacidade de nos livrar das amarras da ganância e do lucro. Quando a luz de Deus toma conta do nosso coração e das nossas decisões, nós começamos a olhar e a entender as coisas da vida e do mundo com o olhar dele, que é de amor e, portanto, somente capaz de doar, doar tudo, doar a si mesmo, sem esperar ou pedir nada em troca. Podemos chamar este amor de gratuidade total. Por nossa vez, a este amor incondicional de Deus, nós podemos responder somente amando generosamente a ele e aos nossos irmãos.

Com Deus não tem negociação, cobranças, reivindicações, prazos… A “vida eterna”, que o homem do evangelho procurava, é um dom gratuito de Deus, é oferecida, doada, nunca será o resultado do nosso esforço ou um direito adquirido pelos nossos merecimentos. Jesus nos ensinou tudo isso; não foi para nos fazer sentir pequenos perante a grandeza sem medidas do amor de Deus, mas para transformar o nosso coração de interesseiro em generoso e compassivo. A sociedade que organizamos funciona com a troca de mercadorias, de serviços e de favores. Estamos tão acostumados com isso, que desconfiamos de quem nos oferece algo sem cobrar nada antes ou depois. Sempre perguntamos quanto custa aquilo que gostaríamos ter ou alcançar.

Também o homem do evangelho deste domingo queria saber o preço da vida eterna, quais obrigações devia cumprir, quais ofertas ou holocaustos devia fazer. Dar de graça aos pobres aquelas riquezas que tinham custado tanto tempo, trabalho, organização e esperteza não entrava na sua cabeça e no seu coração. Vale a pena nos perguntar se aprendemos a gratuidade nas nossas famílias, ou se também nelas já funciona a lógica interesseira do mundo. Filhos, crianças e adultos, que não sabem mais agradecer aos pais por tudo aquilo que fizeram por eles. Esposos e esposas que perderam a alegria de se doar e de se receber cada um como uma dádiva não merecida. Parentes que se odeiam por causa da herança deixada pelos pais e avós. Temos dúvidas que Jesus aprendeu a gratuidade também com Maria a José? Ele, o homem justo e obediente, acolheu Maria em sua casa, acreditando nos seus sonhos e na palavra dela. Ela, a serva do Senhor, ficou feliz de colaborar com o projeto de Deus sem saber tudo o que a aguardava e se teria merecido alguma recompensa. E Jesus? Ele deu tudo, até a própria vida, porque Deus é assim, só amor doação.

O que o poeta quis dizer?

O que o poeta quis dizer?
Antonio Juraci Siqueira*
Quando estudante, essa foi uma pergunta que ouvi várias vezes em salas de aulas feitas por professores de português em trabalhos de análise de textos. O(a) professor(a), apresentava um poema aos alunos para que analisassem e ai daquele cuja interpretação passasse longe da pré concebida pelo professor. Não sei se atualmente essa pergunta ainda é feita aos alunos. Lembro do filme “Sociedade do Poetas Mortos” que inicia com um professor analisando um poema com base em equação matemática sem atentar que a poesia é arte e, como tal, não pode ser analisada racionalmente, senão pelos sentidos. A estética se vale do juízo de valor, subjetivo, para analisar uma obra de arte e não do juízo de fato, objetivo, como fazem as ciências exatas. Triste da obra de arte que não sirva a mais de uma interpretação! Mário Quintana disse num poema: “Quando te perguntarem o que quiseste dizer com teu poema, perguntar-lhes: o que Deus quis dizer com este mundo?” Ou como disse Salvador Dali: “Como querem entender os meus quadros se eu que que os faço não os entendo?” A pergunta tem sentido pelo fato que a arte deve ser sentida e não compreendida. O poeta não “quis dizer”, ele efetivamente disse com todas as letras. Dane-se o que ele quis dizer, vale o que o poema disse para cada leitor. Como no jogo do bicho, vale o escrito. Não há nada mais patético, mais melancólico, que o artista explicar sua obra, como vi, certa vez, um pintor explicando, numa exposição, uma pintura surrealista de sua autoria. O máximo que ele consegue é esvaziá-la. O simples título de uma obra já induz, já direciona a interpretação do público. Em 1984, participei e ganhei um concurso promovido pela secretaria de cultura de São Bernardo do Campo, São Paulo, na época das grandes greves do ABC paulista, tempo em que o Lula surgia como o grande líder metalúrgico. Dei o título de “Povo” ao poema pois era a ele que me dirigia naquele momento em que estávamos quebrando as algemas da ditadura militar. Publiquei com esse título na página “O Jornaleco” de A Província do Pará mas quando o incluí no livro “Travesseiro de Pedra”, em 1986, mudei para “Oleiro e Barro”, mudando completamente o olhar do leitor. Agora a mensagem é direcionada ao indivíduo e não mais ao povo. O professor Pedro Holanda, no seu TCC sobre a minha obra, pela UFPa, o remeteu ao Genesis, com Deus e não o poeta falando ao homem. Portanto, dane-se o que eu quis dizer e viva o que o poema disse e diz a cada leitor. E para você, o que foi que eu disse nesse poema?
OLEIRO E BARRO
Acorda! Já é dia e o teu destino
é fazer teu destino caminhando!
Tu és, ao mesmo tempo, oleiro e barro;
tu és, num só momento, o boi e o carro!
Acorda! O tempo urge…Tu não sabes
que deténs as rédeas da ação?
Tu és a solução dos teus problemas
e a chave que abre tuas algemas
repousa, eternamente, em tua mão!
Levanta! O sol se põe… Bate a poeira
acumulada por tantos verões!…
Tu és a vela-mestra da História,
o caminho que conduz à glória,
a semente das revoluções!

*Antonio Juraci Siqueira é poeta, professor, escritor, autor de mais de 70 livros

Qual riqueza? – Dom Pedro José Conti

Qual riqueza?
Dom Pedro José Conti – Bispo de Macapá

Certo dia, o marido disse à esposa:

– Sabe, querida, trabalharei muito e, um dia, seremos ricos.  A esposa respondeu:

– Querido, nós já somos ricos. Porque eu tenho você e você tem a mim. Um dia, talvez, teremos dinheiro.

No evangelho de Marcos, deste domingo, encontramos Jesus e seus discípulos andando, quase às escondidas, pela Galileia. Na realidade, “o segredo” está no segundo anúncio da paixão. Ele fala também da ressurreição, mas os discípulos “não compreendiam estas palavras e tinham medo de perguntar” (Mc 9, 32). Entendemos que o assunto é sério e que sempre será muito difícil aceitar Jesus como “messias” sofredor. Mais ainda: um messias perdedor, sem mais nada, sem poder nenhum, vergonhosamente derrotado. Talvez os discípulos tivessem medo de lhe pedir uma explicação mais clara para não ter que reconhecer que aquelas palavras de Jesus derrubavam os sonhos de grandeza que, secretamente, acalentavam. Aqueles seguidores representam todos nós e os cristãos de todos os tempos. A razão é simples. Os reinos e as sociedades humanas funcionam como uma pirâmide de poder. De uma maneira ou de outra, quem está em cima manda em quem está em baixo. Vez por outra, as coisas parecem melhorar; mudam as leis e os sistemas de governo, mas sempre aparece algo que, do alto, “pesa” mais que outras coisas. Hoje, vivemos sob o jugo da economia, das leis do mercado. Tudo bem misturado e aliado com o poder das armas, da tecnologia, dos meios de comunicação que exaltam o individualismo e o consumismo. Alguém duvida que estejamos vivendo tempos de grandes disputas? As contendas começam em nossas famílias e nem as religiões escapam das confrontações. Todos querem ganhar, sobressair, estar por cima, ser os maiores, ser os primeiros. Poder e riquezas continuam fascinando.

Jesus, o Mestre, tem algo importante para nos dizer. É quase um “segredo”, é para poucos, porque também é muito difícil de ser entendido e acolhido. Por isso, fala “em casa” e chama só os doze ao seu redor. Primeiro explica: “Se alguém quiser ser o primeiro, que seja o último de todos e aquele que serve a todos!” (Mc 9,35). Mas, a quem servir? Eles devem lembrar outras palavras dele. Devem “servir” aos pequenos, aos pobres, àqueles que nunca poderão devolver o que receberam. Isso para que o serviço da caridade não seja interesseiro, não tenha outro objetivo a não ser o bem daqueles que foram ajudados. De outra maneira, deixaria de ser um gesto de amor e seria uma troca de favores, a ser cobrada antes ou depois. Logo em seguida, Jesus, para ajudar a entender o que quer nos ensinar, pega uma criança e a propõe como modelo de pessoa que deve ser abraçada, acolhida e servida por causa dele, para honrar o nome dele, e, por isso, de maneira totalmente amorosa e gratuita. Uma criança! Exemplo claro de alguém que, muitas vezes, passa despercebido, quase invisível.  Alguém que, naquele tempo, pouco ou nada valia. Só dava despesa e devia ser cuidada. Ainda não produzia nada, não podia ser uma força de trabalho.

Hoje, parece muito diferente, mas nem tanto. Falo dos milhões de crianças fora da escola por causa das guerras, das migrações, da fome e da miséria. Têm crianças transformadas em soldados, violentadas em sua inocência ou exploradas em sua dignidade. Têm crianças vendidas como mercadoria, roubadas de sua infância e usadas para satisfazer os desejos e as ambições dos adultos. Apesar de tantos progressos, continua difícil para os mais velhos acolher as crianças como elas são, como elas vêm ao mundo, com seus limites, mas também com o direito de serem diferentes de como, talvez, os pais as queriam. Isso porque cada pessoa é um dom de Deus único e irrepetível. Dom e desafio ao mesmo tempo para ser acolhido e amado, com total gratuidade, sem condições ou chantagens. Jesus nos ensina que para Deus Pai cada pessoa vale por si mesma, é um verdadeiro tesouro, uma riqueza incomparável. Só quem ama sabe dar o verdadeiro valor às pessoas amadas. Pode faltar dinheiro, mas quanta riqueza temos em nossas famílias! Ainda não a descobrimos?

O belo vaso quebrado – Dom José Conti

O belo vaso quebrado
Dom Pedro José Conti – Bispo de Macapá 
Um casal de namorados estava passeando. A moça, olhando a vitrine de uma loja, ficou encantada com um lindo vaso chinês. Seu namorado foi indagar o preço. Era caro demais para ele. Andando pela loja, porém, viu um vaso igual, mas quebrado. Teve uma ideia. Uns dias depois, comprou, quase de graça, o belo vaso quebrado e pediu ao dono que o embrulhasse como se fosse um presente. O seu plano era chegar na casa da namorada e simular um tombo. Assim, poderia dizer que o vaso tinha se quebrado naquele momento. Deu tudo certo, e a namorada acreditou nele até desembrulhar o vaso. Então constatou a mentira. O dono da loja havia embrulhado cada pedaço do vaso quebrado separadamente! A moça ficou muito decepcionada com o namorado que queria enganá-la.
Neste 22º Domingo do Tempo Comum, voltamos a ler o evangelho de Marcos. Jesus é questionado pelos mestres da Lei sobre o fato de alguns dos discípulos dele não lavarem as mãos antes das refeições. Era um simples costume de higiene, mas tinha-se transformado numa regra rigorosa. Com base nela, as pessoas eram julgadas “observantes” ou não da “lei” e, portanto, nada menos, se eram obedientes ou não a Deus. Ao voltar do mercado, onde circulava todo tipo de gente, animais e mercadorias era necessário tomar banho, porque o contato com pessoas ou coisas “impuras” podia ter contaminado os bons judeus. Uma questão de simples e prudente “limpeza” tinha se transformado numa questão de “pureza” religiosa. Jesus chama de “hipocrisia” essa excessiva preocupação dos mestres da Lei, porque eles ficavam olhando a limpeza exterior e se descuidavam do que era mais importante: a pureza do coração. O que interessa mesmo a Jesus é o que se passa no “interior” das pessoas. O que fazemos pode parecer limpo e até chamar atenção exteriormente. Podemos enganar os homens, mas não conseguimos mentir para Deus, porque ele “vê o que está em segredo” (Mt 6,4). Com efeito, a grande verdade é esta: as boas ou as más intenções do nosso agir vêm, antes de outras motivações, do profundo do nosso coração (Mc 7,21-23).
Nestes tempos de pandemia, estamos vivendo a experiência de ter que passar álcool e lavar as mãos inúmeras vezes, sempre que suspeitamos o perigo do vírus. Não é que antes fôssemos tão “sujos” assim e que nunca lavássemos as mãos, mas agora tudo isso virou obrigação, preocupação e até frenesi. Com tanta “água e sabão” ficamos mais limpos? Com certeza “por fora”, mas, “por dentro”, continuamos os mesmos.
Talvez as palavras de Jesus nos ajudem a encontrar o melhor “detergente” para limpar o nosso coração. O contrário da “hipocrisia” é, sem dúvida, a sinceridade.
 Quando damos lugar a segundas intenções, quando praticamos certa duplicidade no nosso agir, quando falamos de um jeito e praticamos de outro, é sinal de que algo está errado conosco. Afinal, quantas pessoas somos? Por que aquela que aparece por fora é diferente daquela que somos por dentro? Não falo de doenças psicológicas ou algo semelhante. Falo mesmo do nosso ser cristãos. Tem uma bem-aventurança de Jesus sobre isso. É aquela dos “puros no coração, pois eles verão a Deus” (Mt 6, 8). Esses “puros” não são os ingênuos que não enxergam as coisas erradas. São aqueles que encontraram o “colírio” para ungir os olhos (Ap 3,18) e ver as possibilidades do bem e do amor apesar das dificuldades e das incertezas da vida. São aqueles que estão vendo Jesus presente nos pobres, nos pequenos, nos sofredores.  Eles veem muito claramente as injustiças. Não fingem não as ver, não as escondem, não aproveitam delas, não as transformam em destino ou, pior, em “vontade de Deus”.
Deveríamos zelar pela nossa sinceridade, sobretudo para não enganar a nós mesmos. Antes de apontar as “sujeiras” dos outros, seria bom “purificar” o nosso coração e o nosso agir. O nosso amigo do vaso chinês não conseguiu enganar a namorada. E nós? Será que vamos poder mentir para Deus e para a nossa consciência? Talvez, mas, vale a pena?