Aluízio Cunha – Os olhos da menina

Os olhos da menina
Aluízio Cunha
Olho os olhos tristes da menina
que perdeu a mãe
que foi ser estrela
que foi ser lua
areia sideral
fragmento de sol.
Olho os olhos da água
querendo sufocar as praias
alagar o mundo
inundar o globo
afogar o universo
querendo deslumbrar-se em Deus.
Olho os teus olhos
bem profundamente, menina,
e surpreendo
doce amor
amarga saudade.
(Extraído da antologia Modernos Poetas do Amapa – Macapá-AP, 1960)

Rosa Sangrando – Poema de Alcy Araújo

Rosa Sangrando
Alcy Araújo (1924-1989)

A rosa sangrava
como um poeta.

Uma rosa atropelada
por passos apressados
de operários nas calçadas.

A rosa sangrava
defronte do anúncio luminoso
amenizado pela luz da manhã
que nascia do mar.

Era uma rosa rubra
sangrando
sem jardim
sem mão mulher
sem os cabelos
de Izaura.

Nunca mais esqueci
aquela rosa sangrando
como um poeta bêbedo
despetalado na calçada.

(Extraído do livro Jardim Clonal)

O Sonho – Osmar Junior

O Sonho
Osmar Junior
Talvez eu erre no meu jeito de fazer o sonho girar como um redemoinho de folhas ao meu redor.
São meus planos, é meu alimento, e gosto de dividi-los, dependo disso, do sonho.
Vou encontrando as pessoas para me ajudar a sonhar.
E com uma delas aprendi sobre as gavetinhas…
Tem planos de amores e sonhos que vamos guardando nessas gavetinhas.
O problema é que não sabemos o que fazer no final com tantas coisas guardadas.
Será que um dia voltaremos a abrir ou pelo menos teremos tempo pra isso ?
Eu mesmo disse algo no espelho que desmontou-me a filosofia e os olhos.
Jamais eu criaria gavetas no meu coração.
Eu tenho é uma mesa para sentar com você e debater o ódio, o calor, o amor e o desamor, a loucura e o sexo, a guerra e a paz… pode levantar e partir e pode voltar quando quiser, traga junto seus sonhos pra você nunca, nunca sumir de mim.
Eu posso ficar sentado sentindo o vento no meu rosto novamente…
Esperando que em outra primavera você venha me encontrar para tentar outro sonho.

Remendando palavras – Luiz Jorge Ferreira

Remendando palavras
Luiz Jorge Ferreira

Filho não se prometa limpar as coisas que espalhei pela casa
Nem amarre as noites lá fora… para que percam a hora de lustrar as estrelas que enferrujam sobre as gaiolas
Não derrube as gavetas no chão, pode misturar as palavras, e palavras misturadas não soam bem.
Há de se atentar com a cicatriz de passos quando correr a vassoura sobre o chão
Deixei muitas caminhadas desenhadas rumo ao horizonte e nunca fui…
São gestos inúteis desenhados sobre as costas do gato de pelúcia
São apostas de um jogo de astúcia com o olhar penetrante dos cães.

Filho respeite os vasos, as flores e as folhas secas, essas são as que mais representam a efusão da vida e se abrigam da vida na morte.

Leia os cadernos, sim os cadernos de folhas soltas partidas, de reconstrução de proparoxítonas, da inclusão suave do til, do desespero do não, e da perplexidade do sim.
Quando for rasgá-lo se for canhoto, troque de mão, as letras choram sob uma pressão muito forte, as suavidades são muito desejadas por elas.

E essa velha casa, a respeite sob suas pisadas… há de lembrar…
Que ela me acolheu com um ventre, que um dia acolherá você.
Escancare as janelas, acenda todas as lâmpadas, molhe todas as plantas, ponha minha fotografia a porta da rua, e espalhe boas novas mesmo que a solidão seja a única expectadora…
Pode ser que a saudade apareça vestida como uma colegial…
Pode ser… pode não ser…
De fato os dias estranhos estão ficando banais.

Hoje teve poesia na Justiça Federal

Hoje a manhã foi repleta de lirismo e poesia na Justiça Federal no Amapá.
O Movimento Poesia na Boca da Noite estendeu lá o Pano da Poesia e encantou estudantes, autoridades e servidores com belíssimas declamações de autoria de poetas amapaenses.

Poeta Arilson, bibliotecária Gilvana, poetas Raquel Braga, Adélia Figueiredo, Ricardo Pontes e Wilson

Foi um momento mágico.Além das declamações, teve varal de poesias, sorteio de livros de autores amapaenses e distribuição de chocolates com trechos de poemas.O Movimento Poesia na Boca da Noite agradece o convite feito pela Justiça Federal, a forma como foi tratado e como tudo foi muito bem organizado e se coloca à disposição sempre que a Justiça Federal quiser e puder repetir estes momentos.

Tiago Quingosta lança seu primeiro livro solo sábado no Mercado Central

O primeiro livro solo do escritor Tiago Quingosta, Aluvional é a segunda obra da Trilogia das Águas, em que são abordadas temáticas relacionadas às experiências de vida do autor na Amazônia, cuja voz é a manifestação identitária de um homem do norte.

Durante seis capítulos e 60 poemas – entre os quais está Imersio, seu trabalho audiovisual, disponível no Youtube – ele percorre seu amadurecimento enquanto escritor e artista, apresentando versos de um homem forte e condizentes com suas dores e realidades.

Aluvional traz a poesia amazônica na sua ambientação e utilização das palavras para descrever o que sente, para fazer o leitor mergulhar nas águas do maior rio em volume de água do mundo, o rio Amazonas, aborda uma jornada poética em meio à maior floresta tropical do mundo.

O lançamento será sábado, às 16h no Mercado Central.

(Ascom)

Tela – Aluízio Botelho da Cunha

TELA
Aluízio Botelho da Cunha

O pincel fixou sombras escuras
nas sobrancelhas da moça
e deu um tom de tardes prematuras
nos olhos claros
da clara judia.
(Também já esbocei olhos e sóis,
subjugando curvas
sobre rosto oblíquo)

Dei traços de luz
em cabelos cor de noite,
e auroras nasceram
do sol ardendo,
houvesse, embora,
eclipse solar.
Se eu modelar, um dia,
novas dimensões da tua presença,
atrairá teu corpo
a lei da gravidade dos sentidos.

(Extraído da antologia Modernos Poetas do Amapa – Macapá-AP, 1960)

Um poema de Neth Brazão

Marcas de amor
Neth Brazão

Mergulho no profundo silêncio
Em queda livre me deixo ir
Levemente a brisa sussurra
Versos indecifráveis
Doces, os quero ouvir…
Ouço um anjo cantando para mim
Penso em você
Penso no beijo que ficou por acontecer
Penso e, me deixo ir
Sigo em viagem solo
Com muito de ti aqui
Desejo que sintas
A mesma saudade que me consome
Quem sabe voltas ao teu lugar
Onde sou toda feita de você
Sou para você
Em um universo solitário
Em um querer sem fim
… Ah! Eu sou tão bonita
Para ficar com a solidão

Um poema de Raquel Braga

INFÂNCIA
Raquel Braga

Quando eu era pequenina
No início do entendimento
Sonhava ser bailarina
E dançar sem pensar no tempo.

E o tempo passou tão depressa
Que transformou completamente
A menina dos meus sonhos, tão liberta
Na mulher que hoje vês na tua frente.

Mas, embora este corpo não aparente
Minha alma continua uma criança
Que te vê ao lado meu, eternamente,
Na vontade de esvair-se numa dança.