Chá das cinco

Perguntas a Papai Noel
Arthur Nery Marinho

Quando em criança o sapato
que tinha pus à janela
lhe esperando. Noutro dia
nem sapato e nem chinela.

Quando em rapaz lhe pedi
para me dar meu amor.
Aqui estou sozinho e triste
fazendo versos de dor.

Que lhe fiz, que não me olha?
que lhe fiz, que não me escuta?
Responda, Papai Noel!
Papai Noel filho da puta!

(Do livro “Sermão de Mágoas”, 1993)

Chá da tarde

Poema com destino à Noruega
Alcy Araújo (1924-1989)

Eu ando com a cabeça baixa e dolorida
tateando na sombra dos guindastes
o corpo flácido das mulheres das docas
dentro das noites do cais.

Por que passam por mim tantos
marinheiros, navios, ondas balouçantes?

Se eu pudesse
descansaria a cabeça dolorida
num saco, num fardo, numa caixa,
depois escreveria um poema simples
e montava-o na onda com destino à Noruega.

E a moça loira que o lesse ao sol da meia noite
não saberia nunca que sou negro, fumo liamba
e tenho as mãos revoltadas e calosas.

(Poema extraído da Antologia Modernos Poetas do Amapá, lançada em 1960)

Obrigada, Confraria Tucuju

Fui homenageada ontem pela Confraria Tucuju no Sarau do Largo dos Inocentes. Digo para vocês que foi uma noite maravilhosa, de muita poesia, alegria, ternura e lirismo. Só coisas que iluminam a alma.
Fiquei emocionada com a homenagem, com a participação do Movimento Poesia na Boca da Noite e  com a presença de tantos amigos. A emoção foi tanta que fiquei com a voz embargada quando procurava palavras para agradecer.
E até agora estou sem palavras, pois uma homenagem daquele tamanho e tão linda deixaria qualquer pessoa assim.
Muito obrigada a todos que fazem a Confraria Tucuju, especialmente a presidente Telma Duarte. Obrigada aos meus irmãos de sonho e poesia do Movimento Poesia na Boca da Noite, a todos os poetas e amigos que lá estiveram e, claro, à minha família.

Eis algumas fotos:

Um dos momentos mais emocionantes: Orivaldo lê uma crônica que meu pai, o poeta Alcy Araújo, fez para mim quando completei 4 anos. (A crônica, cujo título é Felicidade, está publicada no livro Autogeografia, do meu pai) . Ao lado de Orivaldo, Julinha é a “Alcinéa criança”. Quando ele terminou de ler a crônica, Julinha levantou-se e declamou “Bilhete”, do meu livro Estrela Azul.

Poetas no Pano da Vida tendo nas mãos estrelas azuis formando o meu nome. Como é que não vou me emocionar com isso?

Confesso que tremi na hora de declamar diante de tanta gente

As crianças Alice, Julinha e Aiury fazem parte do Movimento Poesia na Boca da Noite e já escrevem poemas. Ontem declamaram não somente poesias minhas, mas de autoria deles também.
E foram tantos amigos declamando poemas meus. Pena que não tenho fotos de todos para mostrar.

Além de muita poesia o Sarau da Confraria Tucuju teve show das bandas Mini Box Lunar e Milionário R-5, muita gengibirra, marabaixo e exposição de fotos, artes plásticas e artesanato.

Foi lindo

Foi lindo o Sarau da Primavera, promovido pelo Museu da Imagem e do Som ontem à noite na Praça Veiga Cabral.
A praça ficou lotada, o que mostra que o povo – principalmente a juventude – quer e gosta de poesia.

Na boca da noite

Na sexta-feira estendemos os panos da Vida e da Poesia, fizemos um varal, e  plantamos poesia na bela Praça Floriano Peixoto.
O grupo, formado por gente de todas as idades, leu, declamou e fez poesia enchendo de lirismo, ternura e amor e a praça.


O encontro que era para terminar às 19h estendeu-se até às 20h30 iluminado por uma lua imensa, linda… um presente de Deus para os poetas que aniversariaram neste dia: Aline, Cléo Araújo e o pequeno Asaf Assunção. Presente também para quem estreava no Movimento Poesia na Boca da Noite: a cantora e poeta Ana Martel e a poeta Roseane – uma amapaense que mora na Alemanha e que veio passar uns dias em Macapá.

O próximo encontro de poetas e amantes da poesia na boca da noite será dia 30, na Praça da Bandeira, das 17h às 19h. E você, leitor deste blog, é nosso convidado especial, portanto, agende-se desde já para viver momentos de ternura e lirismo na boca da noite.

Chá das cinco

Poema com sabor
Janete Lacerda

Fosse possível
Degustar um poema,
Este seria
Sabor “m&m”.
Não que consista
Em poema de marketing,
Nem que ele seja
O melhor chocolate,
É que “m&m”
É sob medida
Para lembrar de você.

Chá das cinco

Marginalização
Pedro Henrique

Observo a rua
Longa e marginalizada
Pela brutalidade dos homens
Pela “nóia” fútil e desmedida
Que despreza a humanidade
A sensibilidade
A simplicidade.

Arando a terra
Para uma miséria que nasce,
cresce, se expande…
Ataca por todos os lados
Derrubando e amassando
A massa,
O pão,
As flores.

A hipocrisia dos homens faz barulho
E todos fingem que não ouvem…
Será possível?

Chá das cinco

Homem nu
Glória Araújo

Eu vi um homem nu
Beijei cada parte do seu corpo e vibrei
Não esqueço o momento feliz que o vi
Chorei e sorri de emoção,
E não deixarei de lembrar
O instante que o amei!

Foi amor à primeira vista!
Este homem que mexeu
Com todas entranhas do meu ser
Era meu filho
Que acabara de nascer.

Meu filho! Meu bebê!

Chá das cinco

MINHA POESIA
Alcy Araújo
(1924-1989)

A minha poesia, senhor, é a poesia desmembrada
dos homens que olharam o mundo
pela primeira vez;
dos homens que ouviram o rumor do mundo pela primeira vez.
É a poesia das mãos sem trato
na ânsia do progresso.
Ídolos, crenças, tabus, por que?
Se os homens choram suor na construção do mundo
e bocas se comprimem em massa
clamando pelo pão?
A minha poesia tem o ritmo gritante da sinfonia dos porões e dos guindastes,
do grito do estivador vitimado
sob a lingada que se desprendeu,
do desespero sem nome
da prostituta pobre e mãe, do suor meloso da gafieira
do meu bairro sem bangalôs
onde todo mundo diz nomes feios,
bebe cachaça, briga e ama
sem fiscal de salão. – Já viu, senhor, os peitos amolecidos
da empregada da fábrica
que gosta do soldado da polícia? Pois aqueles seios amamentaram
a caboclinha suja e descalça
que vai com a cuia de açaí
no meio da rua poeirenta.
Cuidado, senhor, para o seu automóvel
não atropelar a menina!…