Poesia no Hospital da Criança

O Movimento Poesia na Boca da Noite estará na próxima sexta-feira, 13, no Hospital da Criança e do Adolescente (HCA), fazendo parte da programação da Semana de Enfermagem.
O convite foi feito pela diretora do HCA, enfermeira Olinda Araújo, e prontamente aceito pelos poetas e amantes da poesia.
Vamos levar poesia, lirismo, alegria, carinho, amor e ternura para as crianças e adolescentes ali internados e também para os profissionais de saúde que trabalham lá.

E você, leitor do blog, pode se juntar a nós para levar amor em forma de poesia aos “pequeninos” que enfrentam problemas de saúde. Isso, com certeza, ajudará na recuperação deles.

Quanto a você, enfermeiro, que escreve mas deixa seus poemas escondidinhos numa gaveta, num caderninho ou no computador, é hora de libertar seus versos. Leve-os para declamar e para enriquecer o nosso varal de poesias. Mas se você não é poeta, leve um poema do seu poeta preferido. Combinado?

Então, gente, todo mundo que gosta de criança e de poesia está convidado para participar do movimento poesia na boca da noite sexta-feira, dia 13, das 17h às 19h, no pátio/estacionamento do Hospital da Criança e do Adolescente. Vale ressaltar que a roda de poesia começa exatamente às 17h.

Chá das cinco

Saudação à chuva
César Bernardo de Souza

Gotas de chuva são lagrimas das nuvens.
O azul do céu é espelho do mar –
Imenso espaço prismático de Deus –
Cúmplice eterno do cálido olhar do sol.

As nuvens choram do alto:
chuvisca aqui, chove acolá!
Então chuva e vento fazem o mar.

Um vento que vem de qualquer lugar,
Balança o rio, assobia e sacode imensidões.
E vem pra cá, depois da praia.
Faz poeira, desalinha o firmamento,
Bravo faz redemoinho,
suave se desmancha,
alegre canta e rodopia.
Então, viva a chuva!

O rio e o mar são ânforas desse pranto.
Que despenca das nuvens,
que escorre no vento,
Deita-se com a terra
e a emprenha de tempo.
E em seu útero se esconde do sol…
e ainda é chuva!
semente da flor.

Poesia na boca da noite

Poetas e amantes da poesia reuniram ontem na calçada da casa de César Bernardo, no bairro Jardim Marco Zero, e fizeram mais uma vez “Poesia na boca da noite”. O encontro previsto para acabar às 19h varou a noite e só terminou no começo da madrugada.
E as pessoas que passavam paravam para ouvir a poesia amapaense. Num certo momento até o trânsito engarrafou na rua Maria Marola Gato. Sim. Os poetas e declamadores, as performances poéticas, chamavam atenção de quem passava. A poesia atrai e encanta.

Neto Mont’Alverne chegou tímido, deixou suas poesias (que nunca havia mostrado pra ninguém) dentro do carro. A turma insistiu, pediu pra ver e ouvir e não demorou muito Neto perdeu a timidez e declamou suas poesias. Seus poemas foram elogiados por todos. “Está no sangue”, disse Bonfim Salgado, lembrando que Neto é neto da grande e saudosa poetisa Aracy Mont’Alverne.

Grande craque do passado, artilheiro na época de ouro do futebol amapaense, Bill Maravilha trocou ontem o bate-papo sobre futebol pelo bate-papo poético. Ao lado da esposa Dayse Pelaes, Bill acompanhou atentamente as performances poéticas

Na mesa, arrumada com tanto carinho por César Bernardo e esposa Consolação, tinha de tudo: petiscos, cervejinha, refrigerante, notebook e muitos livros de poesias. Professor Antônio Munhoz levou poemas manuscritos de vários autores amapaenses. Os manuscritos, em folhas de  papel almaço  amareladas pelo tempo, tem mais de 30 anos. Foi emocionante. Emoção também quando Munhoz declamou um soneto de José Araguarino Mont’Alverne e exibiu um livro autogrfado de Alcy Araújo, de 1965

A proprietária e o gerente da “Nossa Livraria” leram sobre “A poesia na Boca da Noite” aqui no blog e foram lá. Yolanda, a proprietária, falou de seu desejo de montar uma estante em sua livraria só com autores amapaenses e nos convidou para que façamos lá lançamentos de livros, tarde/noites de autógrafos, bate-papo com leitores etc.
Obrigada, Yolanda, pelo espaço que você está disponibilizando para a literatura amapaense. Acho que a partir da semana que vem os livros dos autores amapaenses já estarão à venda na “Nossa Livraria” (Av. Presidente Vargas, entre Eliezer Levy e Odilardo Silva)

Na próxima quinta-feira, 3, estaremos falando, declamando e fazendo “Poesia na Boca da Noite”, no Largo dos Inocentes, em homenagem aos 253 anos de fundação da cidade de Macapá. É ali, no centro histórico, que vamos homenagear Macapá. Nosso encontro começa às 17h. Qualquer poeta ou amante da poesia pode participar.
Vai lá, leva um banquinho ou uma cadeira, uma poesia sua ou do autor de sua preferência; se quiser pode levar tambéns uns biscoitinhos, e vamos demonstrar todo nosso amor à cidade de Macapá e à poesia amapaense.

Veja mais informação e mais fotos do encontro de ontem no blog do Rostan Martins, clicando aqui

Chá das cinco

Beijo Divino
Graça Penafort

Manhã chuvosa
Lágrimas do céu caem sobre nós.
O coração desconhece a dor e a alegria.
Só os sentidos falam.
Entre o verde repousante,
bela, glamurosa, delicada,
abre-se à Luz a perfeição do Universo.
Limito-me a contemplá-la.
O impulso é devastador: arrasta-me!
Meus lábios tímidos procuram as pétalas molhadas.
Isso basta.
Um quase imperceptível perfume desperta-me à poesia.
É o beijo divino na minha boca profana.

87 anos do nascimento do poeta Alcy Araújo

MINHA POESIA
Alcy Araújo

A minha poesia, senhor, é a poesia desmembrada
dos homens que olharam o mundo
pela primeira vez;
dos homens que ouviram o rumor do mundo pela primeira vez.
É a poesia das mãos sem trato
na ânsia do progresso.
Ídolos, crenças, tabus, por que?
Se os homens choram suor na construção do mundo
e bocas se comprimem em massa
clamando pelo pão?
A minha poesia tem o ritmo gritante da sinfonia dos porões e dos guindastes,
do grito do estivador vitimado
sob a lingada que se desprendeu,
do desespero sem nome
da prostituta pobre e mãe, do suor meloso da gafieira
do meu bairro sem bangalôs
onde todo mundo diz nomes feios,
bebe cachaça, briga e ama
sem fiscal de salão. – Já viu, senhor, os peitos amolecidos
da empregada da fábrica
que gosta do soldado da polícia? Pois aqueles seios amamentaram
a caboclinha suja e descalça
que vai com a cuia de açaí
no meio da rua poeirenta.

Cuidado, senhor, para o seu automóvel
não atropelar a menina!…


Alcy Araújo – o  poeta do cais, dos anjos, das borboletas, do jardim clonal, dos marinheiros e de tudo que merece ser amado – nasceu no distrito de Peixe Boi (PA), no dia 7 de janeiro de 1924.
Criança ainda transferiu-se com a família para Belém, vivendo depois em pequenas cidades da região norte para onde seu pai, Nicolau Cavalcante, era destacado para implantar os serviços de Correios e Telégrafos.
De retorno a Belém, Alcy cursou a Escola Industrial tornando-se mestre marceneiro e de outras especialidades relacionados ao ofício, que exerceu por algum tempo.

Na redação do jornal “Folha do Norte”, em Belém

No entanto o talento literário, a vocação pelo jornalismo e um precoce desenvolvimento intelectual levaram Alcy a trocar a bancada da oficina pela escrivaninha do jornal, em 1941, com 17 anos de idade. Por mais de uma década trabalhou nos principais jornais do Pará como repórter,articulista,  redator e chefe de reportagem, entre eles a Folha do Norte, O Estado do Pará e O Liberal.
Veio para o Amapá na década de 50, trazido pelo poeta e amigo Álvaro da Cunha. Aqui exerceu importantes cargos, assessorou vários governadores, dirigiu jornais, lutou pela emancipação política e administrativa desta região, combateu a exploração dos recursos naturais, fez importantes trabalhos de pesquisa sobre rizicultura, erosão dos solos, pesca no litoral, entre outros. Contudo, acredito que a maior contribuição dele ao Amapá deve ser aferida pela sua imensa e constante participação na vida intelectual e artística – tanto através da imprensa, como nos demais instrumentos e instâncias da cultura amapaense.
Amante das artes, foi ele que lutou, ao lado de R.Peixe, pela criação da Escola de Artes Cândido Portinari e do Teatro das Bacabeiras.

“Aqui estão as minhas mãos, falando palavras feitas de pássaros e de ausências e cantando canções sonhadas em segredo.” (Alcy Araújo)

Junto com Álvaro da Cunha, Ivo Torres, Arthur Nery Marinho e Aluízio da Cunha, movimentou o segmento cultural amapaense criando clubes de arte, promovendo noites lítero-musicais, apoiando artistas plásticos,  fundando e dirigindo revistas culturais difundindo a cultura do Amapá por este Brasilsão, entre mais tantas coisas que deixariam imenso este texto se fossem listadas aqui.

“Ele foi um dos mais macapaenses de todos os paraenses que ajudaram a desenvolver o Amapá”, escreveu certa vez o jornalista Hélio Penafort.

Foi editor, noticiarista, diretor, colunista, articulista e editorialista de vários jornais amapaenses. Jornalista emérito, arguto analista dos problemas dos problemas sócio-econômicos do Amapá, foi na poesia que Alcy Araújo universalizou mais profundamente seu talento. É o único poeta do Norte a figurar na “Grande Enciclopédia Brasileira Portuguesa”, editada em Lisboa. Está também na enciclopédia “Brasil e Brasileiros de Hoje” e em tantas outras obras como “Introdução à Literatura”, “Poesia do Grão Pará”, Antologia Internacional Del Secchi, Coletânea Amapaense de Poesia e Crônica, Antologia Modernos Poetas do Amapá e coletânea “Contistas do Meio do Mundo”.
Em 1965, pela Editora Rumo, foi lançado seu primeiro livro: Autogeografia (poemas e crônicas). Em 1983, comemorando os 40 anos de Alcy dedicados à poesia,  a Editora do MEC lançou no Rio de Janeiro seu livro “Poemas do Homem do Cais” e em 1997 foi lançado pela Associação Amapaense de Escritores o livro “Jardim Clonal”.

Numa noite de sábado, 29 de abril de 1989, Alcy Araújo partiu para o cais definitivo levado pelas mãos do seu Anjo da Guarda. Partiu deixando inéditos, prontinhos para publicação, os livros “Ave Ternura”, “Histórias Tranquilas”, “Cartas pro Anjo”, “Mundo Partido”, “Terra Molhada”, “Tempo de Esperança”, “Poemas pro Anjo do Natal”, entre outros, que a família tem esperança de um dia vê-los publicados e sonha com a publicação da “Poesia Completa”, deste que foi o maior poeta do Amapá.
Alcy Araújo Cavalcante, meu pai, tinha a alma pura,  de criança que acredita no Natal e na Esperança e assim cheio de esperança colocou sua poesia a favor da luta por um sociedade melhor, livre das desigualdades e das injustiças.

Participação
Alcy Araújo

Estou convosco.
Participo dos vossos anseios coletivos.
Vim unir meu grito de protesto
ao suor dos que suaram
nos campos e nas fábricas.

Aqui estou
para juntar minha boca
às vossas bocas no clamor pelo pão
sancionar com este rumor que vai crescendo
a petição de liberdade.

Estou convosco.
Para unir meu sangue ao sangue
dos que tombaram
na luta contra a fome e a injustiça
foram vilipendiados em sua glória
de mártires
de heróis.

Vim de longe
percorrendo desesperos.
Das docas agitadas de Hamburgo
das plantações de banana da Guatemala
dos seringais quentes do Haiti.
Vim do cais angustiado de Belém
dos poços de petróleo do Kuwait
das minas de salitre do Chile
Passei fome nos arrozais da China
nos canaviais de Cuba
entre as vacas sagradas da Índia
ouvindo música de jazz no Harlem.
Afundei nas geladas estepes russas.
morri ontem no Canal da Mancha
e hoje no de Suez.
Tombei nas margens do Reno
e nas areias do Saara
lutando pela vossa liberdade
pelo vosso direito de dizer
e de amar.

Estou convosco.
Voluntariamente aumento o efetivo
dos que não se conformam
em viver de joelhos
morrendo sufocando lágrimas
nas frentes de batalha
nas prisões
para dar à criança recém-parida
o riso negado aos vossos pais
o pão que falta em vossas mesas.

Meu filho
e o filho do meu filho
saberão que o meu poema não se omitiu
quando vossas vozes fenderem o silêncio
e ecoarem inutilmente nos ouvidos de Deus.

(Do livro Poemas do Homem do Cais, do poeta Alcy Araújo Cavalcante,lançado no Rio de Janeiro em 1983)

Alcy não se separava da sua máquina de escrever – uma olivetti portátil – nem quando precisava ficar internado para cuidar da saúde. Na foto, o poeta internado no Hospital São Camilo, recebendo a visita do padre Jorge Basile e escrevendo

POR ISTO HOUVE SILÊNCIO
Alcy Araújo

O homem havia sido feito assim: bom, humilde, terno para viver dentro de um mundo cheio de revolta. E o mundo foi angustiando o homem, rasurando a sua ternura, arranhando a sua bondade. Por isto que o homem, vítima de muitos desencantos, começou a fazer o que não devia, a andar de cabelos ao vento, telefonar, freqüentar o cais.

A cada sofrimento, o homem fazia mais uma tolice e magoava o seu Anjo. E o Anjo, pobre Anjo aflito, chorava lágrimas imensas, que cresciam em seus olhos como pássaros de luz.

Daí então o Anjo não pôde ter mais um minuto de distração. Mal ele se distraía e lá ia o homem por aí, pés descalços, braços nus em direção ao seu desconhecido, pisando espinhos que nasciam das rosas vermelhas.

Mesmo assim o homem sabia que não estava só, como naquele começo de tarde em que teve vontade de comprar uma bicicleta azul e um cavaquinho. Sabia também que não estava só como naquele poema em que o amor morria por falta de azul e os pássaros brancos deixaram de nascer.

E por ser assim o homem falou ao Anjo que a felicidade existia. Apenas estava além das lágrimas contemporâneas, colocada depois da dor, na continuidade da espera, na renovação de todas as esperanças.

E falou isto quando as estrelas gotejavam silêncio dentro da noite. A música se enovelava no coração e o poema era uma oração nascente.

Então o Anjo pegou o homem pela mão e caminharam em direção ao mar. Foi quando Deus sorriu e achou que o que tinha feito era bom. E descansou, porque era chegado o sétimo dia e na distância Anjo e homem se integravam no azul do mar. Por isto houve um grande silêncio no coração das coisas…

Boa noite!

LIRISMO
Alcy Araújo Cavalcante

Não
eu não te darei
um malmequer.

Eu te darei
uma rosa de todo o ano
e uma estrela
e uma lua branca
muito branca
um lírio
– porque os polichinelos
ficaram inanimados no bazar.

Depois
farei o poema do nosso
primeiro beijo.
Recostaráss a cabeça
no meu peito
e meus dedos compridos
acariciarão teus cabelos.

Deus saberá então
que estamos nos amando
pois haverá luz
e um grande silêncio
no pensamento das coisas.

Chá das cinco

ANÚNCIO
Álvaro da Cunha

Eu estou sonhando com um regaço de virgem,
onde eu ponha a cabeça
e adormeça
quando este mundo se despedaçar.
Será que este quebranto no meu corpo
não é cansaço,
mas um pretexto para repousar?

– A vida é triste, o mundo é triste,
o amor é triste.
Quem me censura o ato de sonhar?

(Ainda posso encontrar o meu desejo
sem arredar um pé deste lugar)

E vou escrever anúncios no jornal:

“Poeta, em Macapá,
está precisando de um regaço de virgem
onde ponha a cabeça
e adormeça
quando este mundo se despedaçar”.
(Extraído da Antologia Modernos Poetas do Amapá – Macapá-AP, 1960)

Conselho de Cultura

Governador Pedro Paulo Dias empossa hoje, às 11 horas no Palácio do Setentrião, os novos membros titulares do Conselho Estadual de Cultura. Entre eles os poetas Ricardo Pontes e Osvaldo Simões (foto).
Os dois serão os representantes da Literatura no Conselho. Eles fazem parte da diretoria do Clube dos Poetas e do Grupo Uni-verso.

Chá das cinco

NUNCA
Alinne Petrina

Eu sinto o gosto da boca
Que eu nunca beijei
Eu sinto o calor do abraço
Que eu nunca dei
Eu sinto o cheiro do perfume
Que eu nunca cheirei
Eu sinto saudades do encontro
Que eu nunca marquei
Eu vejo o sorriso
Que eu nunca apreciei
Mas eu vejo os olhos atentos
Que sempre me olharam
As mãos que nunca me tocaram
E as palavras que secavam
As minhas lágrimas
Que ainda caem por nunca te ter
Sim, amar é sofrer
Como eu posso ser feliz
Se eu não posso ter você?
É “possível” que o tempo
Acalme esse sentimento
Que brada em meu coração
E ainda que o tempo
Leve as lembranças do teu olhar…
Eu nunca…
Nunca, mesmo
Deixarei de te amar…