Clube do Filme

igor2O Farrapo Humano

O sonho de Don Birman ( Ray Milland) era se tornar escritor. Aos 19 anos, o promissor estudante tem seus contos publicados em revistas famosas e recebe proposta: mudar para a cidade grande e seguir o seu objetivo. Lá, ele tentafil1 escrever um, dois, três romances sem sucesso algum. Uma voz interior o convence de que beber um pouco pode ajudar mais no exercício criativo. Não demora muito para o álcool, somado aos seus sonhos frustados, comecem a corroer a dignidade e controlar as ações do pobre homem.

Essa é a história por trás do protagonista de Farrapo Humano ( The lost weekend,1954), filme dirigido pelo diretor Billy Wilder.Sem didatismos ou lição de moral, o diretor constrói ,com bastante cuidado, a personalidade do personagem principal e a sua relação com a bebida. Logo após a abertura do filme, vemos o protagonista arrumando as malas para um fim de semana com o irmão em uma fazenda. Na janela do quarto, uma bebida está presa por uma corda, esperando a hora de ser embalada com as outras coisas da viagem.

Nos minutos seguintes, a narrativa se encarrega de mostrar o quanto a bebida norteia as ações do protagonista. Don Birman manipula, mente e rouba para conseguir o gole do dia. Mesmo o primeiro encontro com a mulher que ele ama só aconteceu por causa da bebida. O filme, apesar de mostrar as ações escusas do personagem , não o vilaniza e muito menos torna as suas ações caricatas.Um diferencial na época. Até então, a indústria cinematográfica nunca havia tratado vítimas de alcolismo de forma tão realista.
Apesar da teatralidade exagerada dos filmes da época, Billy Wilder optou por fazer um filme cru. A agonia do decadente protagonista é expressa de maneira fabulosa por Ray Milland, que conseguiu passar toda a agonia da abstinência com seus olhos arregalados, mãos trêmulas e um repertório de frases tristes e belas. As cenas medonhas de delirium tremens( a psicose causada pela abstinência de álcool ) são verdadeiros filmes de terror. A letra “X” aparece diversas vezes em sombras ou outros elementos da fotografia para mostrar a completa falta de esperança para o personagem. O pessimismo predomina.

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A indústria cinematográfica da época não reagiu bem ao retrato visceral que o diretor fez do alcolismo. O cinema , até a realização deste filme, só havia retratado alcoólatras de maneira caricata e o filme foi um golpe duro para a indústria do álcool, fortalecida pelo fim da Lei Seca nos Estados Unidos. Por essa razão, o filme possui um final “feliz” que acaba contrastando com toda a atmosfera pessimista que permeia a história. Ainda assim, as últimas linhas ditas pelo protagonista não são nada felizes:

“…E lá fora, na grande, grande selva de pedras
Fico pensando quantos há como eu
Pobres homens amaldiçoados, queimando de sede
figuras cômicas para o resto do mundo
enquanto rastejam cegamente para outro copo
outra noitada, outra farra….”

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