Cronistas do blog

Seja criança quando ainda se pode …
Lilian Monteiro

A melhor fase da vida talvez seja quando somos crianças, muitas pessoas alegam sem dúvida alguma, sentirem falta das brincadeiras, da falta de responsabilidade que a idade infantil proporciona, dos sonhos nascidos através de uma imagem, voz, onde tudo se descobre e  tudo se pode, inclusive ser sincero demais é permitido quando se é criança.

A minha infância foi regada a brincadeiras de roda, a famosa pira pega, pira esconde, pular elástico então nem se fala, subir nas mangueiras, nas goiabeiras, nas ameixeiras tudo com muita vontade de aproveitar o máximo a infância.

Sou jornalista e essa profissão que escolhi foi devido a admiração que nutria e ainda tenho pelo meu tio Jackson Barbosa.  Eu era pequena, tinha nove para dez anos, e escutava as  histórias que ele contava quando vinha passar férias em Macapá.

Muito aprendi com o tio Jack, como histórias de lutas, de idéias libertadoras, de um mundo melhor por meio de sua atuação revolucionária de ver o mundo e não se acomodar com o que é imposto para nós. Naquele momento em que eu ouvia seus relatos, algo de novo nascia em mim, até hoje não sei o que de fato, mas alguma coisa me fez ver as coisas de vários ângulos.

Os anos  passaram, eu cresci, fiz a trajetória normal do curso da vida, mesmo em ordens inversas, brinquei, estudei para ser jornalista, tive filho e depois casei, mas me uni com o pai da minha filha, treze anos juntos, que felicidade é para mim.

Confesso que não sou uma jornalista que se cria na noite amapaense, mas minhas raízes estão aqui nessa cidade, sou filha da terra, gosto daqui. Nasci no bairro Santa Rita, trabalho no Santa Rita e moro no Buritizal. Para chegar em casa sempre depois das seis, passo todos os dias pela rua Claudomiro de Moraes e sempre me deparo com crianças , adolescentes e jovens se prostituindo, elas tem a idade que eu tinha quando comecei a sonhar.

Essas crianças mulheres afirmam que são donas do seu próprio corpo, e que os seus corpos são seu ganha pão e não tem nenhuma outra alternativa para se sustentarem. Eu fico impactada toda vez que passo pela Claudomiro e vejo a  cena se repetir todos os dias. Mas é só isso, cadê a minha vontade de mudar o mundo, onde estão meus ideais? O fato é que eu também não faço nada. E até quando?

Essa pergunta tem sido feita, dia após dia, pela minha consciência e minhas mãos estão atadas perante  essa sociedade que sabe julgar como ninguém, e que mostra apenas os caminhos onde se pode ir, sem oferecer uma ajuda coerente para as meninas que vendem seus corpos por R$ 20.

A minha covardia de fazer algo pelas jovens da Claudomiro foi superada pela coragem, que aprendi quando era criança, quando sonhei quando criança. E tenho fé, que essa situação pode ser mudada, mesmo que muitos digam que o problema social no Brasil é um arcabouço sem fim.

  • Grande reflexão, belo texto, mas quem são os culpados? somos nós, ela, o governo, eu também não sei, porém não gosto de julgar a condição de ninguém, mas não queria ver minhas filhas nesta condição. Isso serve para refletirmo, pois será que estamos executando o papel de cidadão, que cabe a cada um de nós??? Parabéns, pela reflexão.

  • Nasci no início dos anos 70, no Brasil a realidade era outra,mesmo assim tive a minha infancia marcada entre as brincadeiras e o trababalho pesado com meu pai,que por não ter residencia fixa não colocava os filhos na escola,o quero dizer é que vivi todas as condições que podia me tornar um bandido:fora da escola,pais pobres e analfabetos.O que me troxe aqui hoje foi o fato de ter visto que o melhor e mais eficiente meio de mudança é a educação.Para as jovens e crianças da Cludomiro falta a família,falta o comprometimento social de todos,falta o Estado e principalmente a educação.

  • Parodiando a Rosa de Hiroshima: “Corruptos do Amapá, pensem nas crianças-prostitutas da Rua Claudomiro de Moraes!”.Vamos fazer o jejum das urnas. O nosso Estado está agonizando na UTI do Hospital da Corrupção.

  • Prezada Lilian Monteiro, admiro sua coragem e sua carreira, não é fácil se deparar com situações difíceis neste mundo e aceitá-las. Infelizmente essa é apenas mais uma de tantas outras que vivemos em nosso planeta. Mas fica a mensagem para reflexão e quem sabe despertar possíveis soluções.

  • Obrigado pelo Post Alcinéa! A melhor solução não é julgar, mas sim refletir e fazem algo, mesmo que seja o mínimo como esse texto. Que olhar vamos ter (O Pensador) ter se só pensarmos em nós e querer que os outros se ferrem hein? Eu Não quero salvar o mundo e nem tenho condições, mas o que der pra ser feito por nós, vale a pena ao menos tentar.

    • A maior parte do dinheiro arrecadado se dissipa na fumaça da maconha e na queima das pedras de crack. Você já assistiu ao filme da Bruna Surfistinha? A realidade da maoria das prostutas de quem tenho notícia vivem essa realidade. Por isso, ganham tanto dinheiro e envelhecem na merda. A propósito, prostituição, pra mim, é um misto de necessidade com uma boa dose de senvergonhice. Já passei muitas privações na vida e nunca me prostituí. Lutei muito pra conseguir tudo o que tenho hoje, com ajuda de amigos sinceros e a certeza de que ninguém me tira.

  • Guardo uma carta do professor Munhoz, onde escreveu: “A infância morreu. O mundo moderno matou a infância”. É a palavra da experiência de vida do grande mestre.

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