SONHO DE NOIVA
Cléo Farias de Araújo
Divinha foi estudar fora. Só vinha à Macapá, nas férias escolares e ficava pançudinha com as guloseimas que sua mãe preparava. Era açaí no almoço e jantar.
Mas, de tanto viver no sudeste, acabou por se acostumar por lá. Se formou, arranjou emprego, comprou casa e tudo o mais. Depois de algum tempo, pegou o telefone e comunicou à família que estava de casamento marcado.
—Uhhh, minha filha, mas tu vem morar pra cá?
—Não, minha mãe. Vou morar por aqui mesmo. Mas não se preocupe que, nas férias, vou continuar indo à Macapá. Afinal, não esqueço as raízes: um bom açaí com farinha baguda, acompanhado de camarão, peixe seco ou jabá, ninguém esquece. —fez uma pequena pausa e arrematou: —Agora, deixa eu falar com o papai.
A mãe, então, chama o Raimundo e lhe passa o telefone.
—Alô!!!???
—Oi, papai, é a Divinha. Tô lhe convidando pro meu casamento e não aceito desculpa nenhuma pro senhor não vir conhecer o Presleyson e ficar pro nosso enlace. O senhor já está aposentado e pode vir.
—Uhhh, minha filha… que bom! Quando vai ser?
—É em maio, o mês das noivas. Dá bem pro senhor e a mamãe se arrumarem e virem pra cá.
—Tá bom, minha filha. A gente vai, num é Maria? —um balanço de cabeça confirmou tudo.
—Então, papai, posso lhe pedir um favor?
—Qualquer coisa, minha filha! Sinto muito orgulho de você.
—Olha, como presente de casamento, só a presença de vocês já vai ser maravilhosa.
—Que que é isso, Divinha. Me sinto no dever de comparecer e ver a tua felicidade, que também é nossa.
—Que bom, papai! Sim, continuando… peço que, quando o senhor vier, me traga 10 litros de açaí do grosso e 20 kilos de farinha do Curiaú. É que o Preleyson, meu noivo, quer ser apresentado à essa iguaria macapaense. Não esqueça: São 10 litros de açaí do grosso e 20 kilos de farinha.
Nisso, Divinha ouve o som característico do telefone já desligado! Mesmo assim, ainda insiste:
—Alô, alô! Papai, o senhor ouviu bem?
Fecham-se as cortinas!!!
20 Comentários para "Cronistas do blog"
Lembrei do tempo que nós moramos no Perpétuo Socorro e meu pai comprava cinquenta centavos de açaí pra mim. Todos os dias, no almoço e na janta ele levava minha caneca pra amassadeira que ficava na rua de casa.
Cléo, parabéns pelo retorno.
Os dois primeiros parágrafos representam muito bem a realidade de muitos amapaenses, inclusive a minha. Daí em diante entram em cena a sagacidade e o sarcasmo do cronista. Aqui os produtos mencionados estão, como diriam nossos pais, “pela hora da morte”, porém, tem a seguinte explicação: Açaí, tornou-se produto de consumo quase universal e a mandioca, pelo menos aqui no Pará, foi substituída pelo cultivo do dendê, ou seja, menor área plantada com mandioca, menor a produção de farinha. Aí, não precisa ser economista para explicar, dói no bolso.
Sds,
Verdade, amigo Ruy. Parece que determinados produtos alimentícios tem prazo de validade. Em outros momentos, parece que são “tirados das prateleiras da moda” e substituídos por outros. Obrigado pela insígne participação. Estamos te esperando pra pescar na canoa nova. Abração!
Estamos pensando em instalar na rampa do SANTA INES a bolsa do mercado futuro do AÇAI.
Excelente ideia, amigo. Tomara que dê certo.
10 litros de açaí do grosso com 20 de farinha: eles vão é revender e ganhar uma grana em cima. O Preleyson é esperto.
Outra coisa, coitado do pai que vai ter que desembolsar uma viagem absurdamente cara e ainda vai somar com esses presentinhos..
Você sacou a esperteza do Presleyson. Que safado esse cara!
Tá tão caro que poderia ser o valor do dote da noiva. Parabéns pela crônica
Valeu, Ducivânia. Ainda bem que o velho não aceitou, de imediato.
Uma passageira esperava sua bagagem na sala de desembarque do aeroporto Juscelino Kibitschek. Quando já havia recolhido sua bagagem no carrinho, outro passageiro pergunta: “Você veio de Belém ou de Macapá?”. A passageira quer saber: “De Macapá. Mas como você soube?”. O outro respondeu: “Por causa do isopor.” Estive em Belém em junho e não fugi à regra. Meu isopor tinha camarão, açaí, farinha de tapioca, charque “Independência” e até chicória. Parabéns pela crônica, Cleo.
É facílimo identificar o nortista. Antigamente, era através do paneiro. Inclusive, o Roberto Carlos, na 1ª vez que foi à Belém, comprou 1 paneiro de farinha, na feira da 25 de setembro. Se o rei pode…
Daqui a pouco não será mais “magnata do petróleo” e sim “magnata do açaí” com o preço aumentando cada vez mais. Parabéns pela crônica pai!
Vamos ficar ricos, meu bem? É só começarmos a plantar pés de açaí e hastes de mandioca. kkk
PRESENTE DE GREGO: Com o preço que está o açaí e farinha sairia mais barato ela ir casar em Macapá….
Parece que, com o início de cada ano,o preço das coisas e não-coisas (!!!???) aumenta e ninguém diz nada.
Esse pedido é de acabar qualquer casamento. Também, com esse alto preço das coisas, principalmente do açaí e farinha, só terminaria assim. rsrsrsrs
Parabéns Cléo!Estava com saudade de ver nesse blog mais uma de suas crônicas publicada.
Bondade sua!
Também, Cléo, a Divinha faz um pedido dos infernos para um aposentado, com o açaí e farinha pelo preço que estão. Parabéns por mais essa bela crônica.
Boa sacada, Evaldy. Com o preço que tá, nem pai aguenta.