Cronistas do blog – Wagner Gomes

O Saudoso PAPARAZZI
Wagner Gomes

wagnergomesSó agora, encontrei tempo para escrever algumas linhas, sobre a morte do fotógrafo Antonio de Sena Cantão, o inesquecível “Paparazzi”. Ele se auto-intitulava de “andaralho”, por percorrer a pés, as ruas de Macapá. Era um “cara lhano”. Lhano no trato com os amigos.

Conheci-o no final dos anos 90, quando estava no exercício da Presidência da OAB/AP. Era o fotógrafo oficial dos nossos eventos.

No antigo “Gato-Café”, lembro, fez cobertura fotográfica da festa de 18 anos de fundação do PT, no Amapá. Posso dizer que era um militante da esquerda, mas nunca soube que tivesse filiação partidária.

A sua morte brutal me causou um grande impacto. Fui um dos primeiros a ser informado.

Ultimamente tenho feito uma reflexão sobre a morte.

E de Steve Jobs, um dos fundadores da apple, pincei:

“…Ninguém quer morrer. Mesmo as pessoas que desejam ir para o céu prefeririam não morrer para fazê-lo. Mas a morte é o destino comum a todos. Ninguém conseguiu escapar a ela. E é certo que seja assim, porque a morte talvez seja a maior invenção da vida. É o agente de mudanças da vida. Remove o velho e abre caminho para o novo. Hoje, vocês são o novo, mas com o tempo envelhecerão e serão removidos. Não quero ser dramático, mas é uma verdade.

O tempo de que vocês dispõem é limitado, e por isso não deveriam desperdiçá-lo vivendo a vida de outra pessoa. Não se deixem aprisionar por dogmas – isso significa viver sob os ditames do pensamento alheio. Não permitam que o ruído das outras vozes supere o sussurro de sua voz interior. E, acima de tudo, tenham a coragem de seguir seu coração e suas intuições, porque eles de alguma maneira já sabem o que vocês realmente desejam se tornar. Tudo mais é secundário…”

E da psicanalista Betty Milan, compartilho:

“Por que Dom Quixote de la Mancha é um dos romances mais lidos do mundo? Possivelmente porque o herói só se deixa governar pela fantasia. Nós nos identificamos com o personagem porque ele não quer saber da realidade. Como os personagens de Gabriel Garcia Márquez não querem. Desconhecem inteiramente o limite entre o imaginário e o real.

Quem leu Cem Anos de Solidão não se esquece de José Arcadio Buendía, “cuja desatada imaginação ia sempre mais longe que o engenho da natureza e até mesmo além do milagre e da magia”. Ele acreditava que era possível desentranhar ouro da terra com um lingote magnético. O leitor também deve se lembrar da mulher de Buendía, Úrsula, que depois da morte do marido continuou a encontrá-lo no castanheiro onde ele passou amarrado os últimos anos da sua vida. Úrsula ia ao jardim lamentar a sorte dos seus descendentes, chorar no ombro do marido e se consolar. No povoado dos Buendía os mortos morrem sem morrer. Por isso, o romance arrebata e, mais que isso, consola.

O nosso maior desconsolo é a perda do ser amado. Só superamos a tristeza quando entendemos que perder não é sinônimo de não ter. Que quem morreu já não está no mundo, mas pode existir em nós. Fazer o luto é entender que a morte não anula a existência e que, sem estar, o morto ainda está. Isso requer tempo. Tanto mais tempo quanto menos ritualizada é a despedida. Nas sociedades em que existe o culto ao ancestral, a morte não deixa quem perde inteiramente desprotegido como na nossa sociedade. Entre nós, evita-se falar da morte e não se tem tempo para a tristeza, o que nos expõe mais ainda aos efeitos negativos dela. Nada é pior do que a tristeza recalcada, de ação sorrateira e consequências imprevisíveis. Quem não chora o seu morto e não é consolado pelos vivos fica sozinho com a perda. Num certo sentido, é marginalizado. Por outro lado, quem não tem tempo para o sofrimento alheio não pode ter relações de amor ou de amizade. E, assim, isola-se também.

Entre nós, ocidentais, o tema da morte é um tabu. Erguemos um muro entre os mortos e os vivos, como se assim pudéssemos afastar-nos dela. A palavra de ordem é não falar disso. À diferença de nós, os povos primitivos cultuavam os ancestrais não só para entrar em contato com o morto, no intuito de reverenciá-lo, como para se fazer ajudar por ele. O morto era integrado ao mundo dos vivos, que se separavam dele sem perdê-lo.

Na falta de um culto dos ancestrais, o recurso que nós temos para superar o drama da morte é a rememoração. Perder o ser amado não significa deixar de tê-lo ao nosso lado. Graças à memória, ele pode permanecer conosco. Fazer o luto é entender isso. Implica tempo e um trabalho subjetivo que leva à consolação. O chamado “trabalho de luto”, no linguajar dos psicanalistas.

A morte tem de ser desdramatizada para que nós possamos sobreviver a ela, e não desperdiçar o tempo que nos resta. Já no século XVI, o pensador francês Montaigne, que refletiu sobre praticamente todos os temas de interesse, diz em seus Ensaios que é preciso não estranhar a morte, incitando o leitor a se acostumar com ela porque, “como não sabemos onde ela nos espera, é melhor esperá-la em todo lugar”. Para Montaigne, essa é a condição da liberdade.

Acostumar-se com a ideia da morte não significa se preocupar com ela. Nada é pior do que viver angustiado diante da ideia de não poder conservar o ser amado, e conservar-se vivo, até o final dos tempos. Quem vive assim torna-se infeliz antes da hora. Preocupar-se com o futuro significa perder o presente, deixar de gozar a existência. Temer a perda é o mesmo que perder.

Carlito Maia, que foi, sobretudo, um filósofo popular brasileiro, dizia que de nada adianta preocupar-se com um problema. Temos de nos ocupar dele e ponto. Porque ocupar-se é uma forma de superar o problema – e viver. Preocupar-se, ao contrário, é uma forma de se enterrar em vida – e morrer. Sabedor disso, ele era tão leve quanto solidário. Valia-se da sua posição prestigiosa na Rede Globo para exercer uma espécie de flower power – celebrava, por exemplo, os eventos culturais de São Paulo, enviando aos amigos flores com bilhetes inesquecíveis. Não está mais vivo, porém, graças ao seu espírito, continua entre nós. O escritor vive para escrever; Carlito Maia viveu para merecer a palavra “saudoso”. É bom tê-lo ao lado.”

Antônio de Sena Cantão, o PAPARAZZI, não era prestigiado pela poderosa Rede Globo, nem enviava flores aos amigos nos eventos culturais do Amapá, mas a sua presença era notada, pois, pela sua objetiva, eternizava o encontro das pessoas nos mais distintos eventos da cidade, fossem eles, também, cívicos ou sociais.

Ele também merece a palavra “saudoso”. E é bom termos ao nosso lado.

Namastê… Al di lá…

  • Parabéns Dr. Wagner Gomes pela bela homenagem ao nosso inesquecível “Paparazzi”, que possuía na minha modesta opinião a mais importante virtude do ser humano “A HUMILDADE”.
    Abs. Matta.

  • O nosso querido decano Costa Gomes a cada dia se supera em seus textos. Muito boa a reflexão sobre a morte e a lembrança do querido Paparazi.

  • Wagnão, o PAPARAZI era nosso amigo e merece a bela homenagem prestada.
    A citação sobre Carlito Maia, que como Paparazzi, viveu para merecer a palavra “saudoso” é bastante oportuna, pois Carlito era um grande publicitário que, inclusive, foi fundador do PT e criou os slogans “LULA LÁ” e “OPTei”.
    Gostei muito do texto e também compartilho a reflexão sobre a morte. Parabéns!

  • Uma homenagem muito justa a uma pessoa querida, pois o Paparazzi sempre se fazia presente nos mais variados acontecimentos sociais de nossa cidade e, com era de praxe, prestigiava com assiduidade os eventos da OAB/AP.

  • Meu caro Wagner, parabéns pelo texto e pela homenagem ao saudoso Antônio de Sena Cantão, a quem você batizou de Paparazzi e que, por ironia do destino, morreu em acidente de carro.

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