Personagens queridas no bairro da Favela

Personagens queridas no bairro da Favela
Milton Sapiranga Barbosa

1- Mundico Sabiá – Foi um dos primeiros a invadir e iniciar o povoamento do bairro. Sim, Favela nasceu em regime de Invasão (esse dado me foi passado pelo sobrinho do seu Mundico, o pedreiro aposentado Franqueira).
Seu Mundico, trabalhava fazendo carretos em uma carroça que pertencia a dona Sara Zagury (conhecida empresária da época e esposa do Sr. Isaac Zagury).
Quando eu estava com preguiça de ir andando até o Igarapé da Fortaleza ou Mercado Central, ficava de plantão próximo a Igreja dos Irmãos, à espera de pegar uma carona na “boléia” da carroça do Seu Mundico e lá ia eu aboletado naquele rústico veículo de tração animal, feliz pela carona e por ouvir piadas e causos que ele contava de quando era rapaz. Seu Mundico era uma figura ímpar, sempre sorridente, era muito querido e admirado pelos favelenses.

2-Congós – Era um negro que andava encurvado amparado por uma vara, que fazia as vezes de bengala. Tio Congó (sem o s) assim todos o tratavam, era excelente no trato com torções, benzedor como ninguém, rezador para curar quebranto e costurava rasgadura. Além de todos estes dons, Seu Congó, tinha sua imagem usada pelas mães para fazer criança parar de chorar ou acabar com birra para não tomar banho ou dormir. Bastava a mãe dizer “lá vem o tio Congo” era um Deus nos acuda. Ele também ajudava as mães, já que sempre fazia menção de partir pra cima do moleque chorão. Mas tudo não passava de fama. Tio Congó era amável e brincalhão quando chegava perto da criançada.
Ele era o dono da grande área onde hoje está implantado o Bairro dos Congós.

3- Antônio Cirino – O homem mais temido (no bom sentido) e respeitado na Favela. Seu Antônio Cirino, conhecia de plantas que curam como ninguém. Até as grandes autoridades de Macapá, como Hildemar Maia, por exemplo, recorriam aos seus preparados e garrafadas milagrosas. Ele tinha um quintal-pomar, com mangueira, goiabeira, mamoeiro, carambola e maracujazeiro, mas moleque nenhum entrava para apanhar uma fruta. Papagaio quando chinava e caía em seu quintal, só se ele fosse pegar e desse pro moleque.
Seu Cirino saía para ir comprar comida na beira e deixava a casa aberta. Alguém entrava em sua casa?. Aqui ó.
Certa vez ele me mandou pegar um remédio para minha mãe que estava em cima de uma mesinha e recomendou: “ pega o vidro, sai e não olha pros lados e nem para trás”. Fui, entrei sem olhar pros lados, peguei o vidro e já na porta de saída, como todo bom moleque que se preza, dei uma olhadela para dentro da casa. Tomei o maior susto de minha vida. Tinha um rolo enorme de cobra ao lado da mesinha que estava o remédio. Saí voando de lá. Quando cheguei em casa, ele me fitou e foi logo dizendo: “Não te disse para não olhar para trás.” Até hoje estou sem entender como ele soube que olhei para trás e não pros lados.

4- Bulivino – Era o negro velho mais folclórico do bairro. Como seu Mundico Sabiá, também vivia de fazer fretes com uma carroça, só que era patrimônio dele. Tio Buliva, como era tratado pela molecada, passava horas e horas contando façanhas de sua juventude, e nós, claro, acreditávamos ou fingíamos acreditar para que ele não parasse com suas historias.
Tio Buliva era torcedor do Bangu Atlético Clube, do Rio de Janeiro. Ou melhor, era torcedor do mestre Zizinho, que segundo os que o viram jogar, era igual ou melhor que Pelé. O sonho de Tio Buliva era ver o seu filho Janjão se transformar num mestre Ziza do futebol amapaense. Era sonho de pai, pois o Janjão não jogava nada.
Tio Buliva vivia numa maré mansa que até parecia ser baiano. Não tinha pressa pra nada e dizia sempre: “pra que correr, onde vou não vai sair do lugar”. Ele era tão devagar que na sua carroça tava escrito “Devagar e Sempre”.
Esta é a minha homenagem ao quarteto aqui destacado, pois eles foram pessoas importantes na minha infância feliz no querido Bairro da Favela.

(Você que acabou de ler este texto do Sapiranga quer homenagear pessoas do seu bairro que foram ou são importantes para você? Escreve e manda pro e-mail [email protected] que a gente publica aqui)

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