Chá da tarde

VOO  AO  VENTO
Rui Guilherme

Apresta-te, meu coração,
Sai a voar ao vento.
Deixa-te levar pela emoção;
Toma da pena a fazer vaga poesia.

Pairando sobre as águas do mar,
Inebriado de estranha alegria;
Acima das altas ondas voar,
Dominado por singular euforia.

Vulcão, terra, fogo, vento,
Fundem-se em perfeita unidade
Compondo um só elemento –
Um só, em sua multiplicidade.

Na instabilidade do outono
Anuncia-se a vinda de um tufão.
Netuno, ao despertar de seu sono,
Concita dos páramos o furacão.

Enormes, apavorantes vagalhões –
Medusas de verde cabeleira desgrenhada –
Formam-se ao ribombar dos trovões
E da ventania enfurecida, desvairada.

Para o alto-mar, para o reino da procela,
Para lá me conduz a inspiração.
Aquela fúria a um só tempo é horrenda e bela,
A despertar cambiante emoção

Que vai do gélido pavor
À mais eufórica admiração:
É Netuno a exigir do admirador
Respeito reverente, submissa contrição.

Ao encerrar tão fantástica viagem
A que me levaram o coração e a poesia,
Volto à terra. Desfeita a miragem
Cumpre recolher-se ao prosaico dia-a-dia.

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