Um poema de Raimundo Donato

O VELHO PAU FURADO
Raimundo Donato dos Santos

Ei-lo que vai
Meio desajeitado,
Andar capenga
De um porrete armado.
Entre risos e apupos
Qual som de mil trabucos
É a voz da garotada
Ressoando ao lado:
“Pau furado”, “pau furado”.

Sua história é vaga,
Não existem lampejos,
Misto de heroísmo
Ou de bravura.
Apenas deixa clara
A desventura
De quem trajeta
Num profundo abismo.

Velho,
Alquebrado,
Sem qualquer vexame.
Tal qual equilibrista
Sobre o arame,
Assim ele vai
Desafiando a morte.

Um dia foi jovem,
Intrépido,
Risonho.
Nunca pensou
Que a vida fosse um sonho
Cheia de lutas,
Guerras,
Pesadelos.

Ontem,
Ao tombar
Seu corpo maltratado,
Triste,
Cansado,
Anônimo,
Doente.
Partiu levando
“O velho pau furado”
A mágoa de ser negro
E de ser gente.

(Donato dos Santos – Poeta amapaense, professor de várias gerações no antigo GM – hoje aposentado e morando no Rio de Janeiro)

  • Dá gosto recitar essa poesia! Mas fiquei “matutando” que essa personagem foi algém real, só conhecido antigamente pelo apelido. Parabéns Donato! Estamos esperando o seu livro, rico de agradáveis memórias de Macapá.

  • A arte de Donato brinca com as palavras, juntando-as, tratando-as com a intimidade de um “oi”. E elas,submissas, respondem: “olá! usa-me, com a sutileza que a tua inteligência permite”.
    Parabéns, Mestre Donato. Sempre jovem. É isso que se quer.

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