Artigo

O discípulo do avarento
Dom Pedro José Conti, Bispo de Macapá

Certa vez um homem avarento ouviu falar que tinha outro homem muito mais avarento do que ele. Então decidiu ir à sua casa com a intenção de tornar-se seu discípulo. O costume exigia que o novo aluno levasse um presente para o mestre. Assim ele levou uma bilha de água, e dentro colocou com um pedaço de papel cortado na forma de um peixe. O grande avarento, porém, não estava em casa e foi a mulher dele que acolheu o novo discípulo.
– Eis um peixe, humilde presente do vosso novo aluno – disse o recém-chegado. A mulher do avarento recebeu o peixe e agradeceu. Mandou o novato sentar-se e depois lhe trouxe uma xícara vazia, convidando-o a tomar o chá. Em seguida, após ter tomado o chá, a mulher do avarento desenhou dois círculos no ar e o convidou a comer um doce. Justamente naquele momento estava entrando o grande avarento e, vendo a mulher desenhar os dois círculos no ar, gritou irritado: – Que desperdício é este? Dois doces? Meio círculo era mais do que suficiente!
A avareza é terrível. Quem tem a doença supervaloriza o que é dele e despreza o que é dos outros. Nunca se desfaz de alguma coisa e vive com o pavor de ser roubado. Pode parecer rico, mas no final é um pobre infeliz. Possui muitos bens, mas não quer usá-los porque de fato, são os bens que mandam e desmandam nele.
Isso é só um exemplo. Muitas outras situações nos parecem favoráveis e por elas, muitas vezes, agradecemos à vida. Na realidade, podem ser armadilhas ou correntes que nos prendem cegando os nossos olhos e amarrando o nosso coração. É a situação de certos ricos que fazem coincidir a felicidade deles com o tamanho das suas riquezas. Na mesma ilusão podem cair os que estão na fartura. Pensam que nunca vai lhes faltar alguma coisa. Também os que vivem correndo atrás das diversões, do prazer e da adrenalina podem estar equivocados. Rir é bom, mas rir sempre pode ser uma moléstia grave. Pior de tudo são os que sempre querem ser elogiados, querem sempre ser os vencedores. Nunca admitem uma crítica, ou que lhes seja encontrado um defeito. Acostumaram-se com os aplausos. O silêncio ou o descaso ao redor deles, os faz sentir inúteis. Caem no desespero. Para tentar sair, são obrigados a criar ilusões, a vender promessas, a planejar cada vez coisas maiores, sempre insatisfeitos, mas fartos das suas próprias palavras retumbantes. São obrigados a rir para não chorar. São obrigados a fazer barulho para não ouvir os gritos dos excluídos. Devem manter a fachada brilhante, para que não seja descoberta a farsa. Fazem de conta que estão alegres.
Se acreditarmos que “quem avisa amigo é ”devemos entender que Jesus pronunciando os famosos “ais” e opondo-os às bem-aventuranças, não quis ameaçar ou amedrontar.
Ele quis alertar os que vivem somente atrás da riqueza, da fartura, da festança e do sucesso. Todas essas situações podem mudar pelas próprias circunstâncias da vida, mas somente quem percebe o quanto são ilusórias procura se libertar buscando a verdadeira felicidade. A turma dos “gozadores” só pode sair da rede traiçoeira na qual caiu se começar a se interessar pelos pobres, pelos famintos, pelos que choram e aprender a dar ouvido à boa notícia anunciada pelos verdadeiros profetas da paz, da justiça e do amor. Só com a partilha e a fraternidade ficaremos livres dos sofrimentos causados pela falta do necessário, pela injusta distribuição dos bens da terra, pela confusão dos valores.
As palavras de Jesus continuam ecoando; cabe a nós cristãos provar que acreditamos nelas praticando o que ele ensinou. Cada um de nós deve refletir sobre o seu jeito de juntar e gastar o dinheiro. Deve avaliar se aprendeu a consolar e a enxugar as lágrimas dos que sofrem. Deve provar com a sua generosidade que acredita que “há mais alegria em dar do que em receber” (cfr. Atos 20,35). Também os ainda muito grandes problemas sociais devem ser olhados do mesmo ponto de vista. A ganância, o desperdício, a desonestidade e a exaltação de alguns, não podem prejudicar o bem-estar, a segurança e a qualidade de vida dos outros.
Não basta traçar dois círculos no ar para dizer que é um bolo. Precisa aprender a produzi-lo de verdade e a oferecê-lo de coração até que o sorriso da esperança apareça no rosto dos excluídos da vida. Não é possível sempre fazer de conta que somos todos felizes.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *