Artigo dominical

O pregador cansado
Dom Pedro José Conti, Bispo de Macapá

O grande pregador estava ficando velho e cansado de falar. Preparar uma hora de pregação, toda sexta-feira, era difícil. Todos, porém, gostavam das pregações dele. Havia um bom grupo de alunos da escola dos pregadores que corriam para escutá-lo e, por isso, ele também não queria decepcioná-los. Ele era brincalhão e deu um jeito para tirar algumas sextas-feiras de descanso. Quando chegou a hora do sermão, o velho pregador perguntou:

– Vocês sabem sobre qual assunto eu vou falar esta noite? – Evidentemente o povo respondeu que não. O pregador, fingindo decepção, disse:

– Como vocês são tão ignorantes, eu não vou perder o meu tempo com vocês, é inútil ensiná-los.

E foi embora sem mais nenhuma pregação.

Na sexta-feira seguinte, ele perguntou novamente:

– Meus irmãos: vocês sabem sobre qual assunto eu vou pregar esta noite?

O povo desta vez respondeu:

– Sim, sabemos.

– Então – continuou o mestre – se vocês já sabem o que eu iria dizer, posso ir embora.

E também dessa vez saiu sem mais nenhuma palavra. O povo ficou encabulado com as atitudes do mestre e assim decidiram que, na sexta-feira seguinte, a metade dos presentes responderia “sim” e a outra metade “não”. Quando o pregador começou a falar perguntou, de novo, se eles sabiam qual era o assunto da pregação. Como havia sido combinado, a metade respondeu que sim e a outra metade que não. Ao ouvi-los, o mestre falou:

– Bom, visto que a metade de vocês sabe qual seria o assunto da minha pregação podem aproveitar e explicá-lo à outra metade que ainda não sabe.

Mais uma vez, o mestre foi embora sem falar mais nada. Foi assim que o velho pregador, cansado, tirou algumas semanas de folga e os seus alunos ficaram pensando se, um dia, haveriam de ter coragem e bom humor suficientes para fazer o que ele havia feito.

Ser pregador não é fácil. Conseguir encontrar argumentos, raciocínios e assuntos para prender a atenção dos ouvintes é sempre um desafio. Todo pregador tem medo de perder o fio da pregação, de ser repetitivo e de não conseguir comunicar o que gostaria. Contudo todo pregador da Palavra de Deus sabe que, mais do que as suas palavras, será o próprio Espírito Santo a tocar os corações dos ouvintes e a fazer-lhes entender e acolher aquilo que o próprio pregador, muitas vezes, nem imagina. A Palavra é maior do que o pregador. Este empresta a sua voz para uma mensagem da qual ele deve ser o primeiro ouvinte. No entanto ele deve fazer todo esforço para comunicar, da melhor maneira possível, a mensagem, colocando também os ouvintes na condição de entender o que ele pretende transmitir. Por fim, todo pregador deve vencer uma grande tentação: achar-se mais importante do que a Palavra de Deus como se ele fosse o dono dessa Palavra e pudesse manipulá-la a seu bem querer.

Nesse sentido, é exemplar a figura de João Batista que encontramos, mais uma vez, no trecho do Evangelho do terceiro domingo de Advento. Às perguntas que lhe fazem para saber quem ele é, responde primeiro o que ele não é! Significa que sabe muito bem ficar no seu lugar e não passar na frente daquele ao qual está preparando o caminho. Se não queremos chamar tudo isso de humildade – porque afinal a missão dele também era importante – vamos chamá-lo, ao menos, de consciência de si mesmo. João Batista era somente a “voz”, depois viria a Palavra. A voz empresta o som à Palavra; a palavra precisa de voz para ser ouvida, mas são as palavras que comunicam. São as palavras que dão sentido aos sons da voz. É a mesma diferença que existe, por exemplo, entre um instrumento musical e aquele que sabe tocá-lo. Para que daquele instrumento musical não saiam somente sons combinados casualmente, precisa de um tocador competente e afinado que dê harmonia ao conjunto das notas.

João Batista, como ele mesmo explica, batizava “com água”. Oferecia um simples mergulho nas águas do rio Jordão como sinal da vontade da pessoa de mudar de vida, de seguir mais de perto a vontade de Deus. O rito de um banho purificador é uma forma simples e singela de reconhecer os erros da vida anterior e, portanto, uma clara manifestação da própria vontade de mudar. Para que o Natal de Jesus não seja uma mera festa tradicional, nós também precisamos nos preparar para acolher Aquele que quer nos ajudar a trocar o mal pelo bem, a mentira pela verdade, a injustiça pela justiça do amor.

Nesta altura, vamos ajudar o pregador do deserto. Quem já sabe do valor do Natal procure comunicar a boa notícia a quem ainda não sabe. Desta vez, não será para dar uma folga ao pregador, mas para ter a coragem de viver o Natal menos superficialmente, comunicando alegria e esperança a tantos irmãos e irmãs que confundem o evento da nossa salvação com uma lenda do passado.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *