O mito e o castigo divino de Sodoma e Gomorra

O mito e o castigo divino de Sodoma e Gomorra
Alexsander Costa

O Homosapiens é a única espécie animal capaz de justificar, através de uma história, o funcionamento de vários acontecimentos da vida terrena.

A esta história chamamos de mito, que passou a existir a partir do momento em que o ser humano despertou conhecimento, poder de análise de experiências, e poder de justificar e conhecer determinados fatos da vida.

O mito tem o intuito de explicar algo que, até então, não tem explicação, algo que a experiência humana sente ou que tenta entender, seja do seu passado ou do seu futuro, do seu nascimento ou da sua morte, seja sobre a vida animal ou vegetal, das estações do ano, de seus costumes ou crenças.

A mitologia surgiu para auxiliar o ser humano a lidar com suas experiências, foi “criada” para ajudar nos momentos de dificuldades que encontramos em vida e assim vislumbrarmos novas realidades.

O mito é, também, uma narrativa etiológica, é diverso, pode nos amparar sobre a origem do mundo: cosmogonia. Sobre origem de Deuses: Teogonia. Sobre a morte ou origem dela: Escatologia. Sobre os fenômenos cósmicos na Cosmologia. Sobre histórias de heróis e muitos outros.

Em gênesis, livro bíblico, vemos um exemplo de cosmogonia, ou mito de criação, quando Deus, o grande criador, cria o mundo: “No principio Deus criou os céus e a terra” (cap. 1). Cria também, o primeiro humano a partir do “pó da terra” (cap. 2): Adão, que vivia no jardim do Edén. Ele ganhou vida para poder cultivar a terra no Paraíso.

Nos escritos Babilônicos, o Enuma Elish, há o relato da criação do universo através da união de deuses. Apsu (Deus das aguas doces) e Tiamat (deusa dos oceanos) que deram origem aos demais Deuses e

também aos seres humanos para que pudessem trabalhar no lugar dos Deuses enquanto estes descansavam.

Nestes escritos também encontramos mitos de criação, além de exemplos de mitos de heróis, como o que observamos na Epopeia de Gilgamesh, o primeiro herói que se tem registro na História. Além deste, a aventura de Utnapishtim no grande dilúvio babilônico, que rivaliza com o dilúvio bíblico protagonizado por Noé, aparece como castigo divino após a criação dos humanos e quando estes desagradaram os Deuses.

Como visto, os mitos possuem forte relação com religião, toda religião possui elemento mítico e ligações com ritos, no entanto a religião não deve ser pensada como o mito propriamente dito.

Na religião católica, em especial no gênesis (velho testamento), podemos observar vários mitos de criação e de heróis. No Cap. 10, o livro sagrado descreve como a terra pôde ser povoada a partir da descendência de Noé. Seus três filhos Sem, Cam e Jafé povoaram o planeta terra após o grande diluvio: desceram da arca, multiplicaram-se e espalharam-se pelas nações.

No cap. 13, versículo 13, há citação à cidade de Sodoma: uma cidade onde moravam homens “perversos e pecadores”, tal qual Gomorra, ambas ficavam próximas ao mar salgado (versículo 3, cap. 14).

Essa história ganha detalhes no capitulo 19: um castigo divino recai sobre as grandes cidades da época, onde o próprio Deus, o criador, lança sobre a Terra larvas de fogo. Mas, Abrãao, um dia antes ao conversar com Deus, tentou convence-lo a não destruir as cidades por conta de corações puros que ainda existiam lá. Ló, um destes homens bons, relutou em abandonar a cidade, ele ofereceu suas duas filhas para que os homens perversos da cidade não abusassem dos anjos enviados por Deus, e sim das moças virgens, em uma tentativa desesperada de salvar sua cidade e seu povo do fogo eterno.

O castigo divino desta vez não viria em forma de inundação porque Deus, ainda no cap. 9, havia aliançado com Noé que jamais a terra seria inundada novamente por sua vontade para castigar os seres humanos.

Os anjos, compadecidos da situação de Ló, pediram para ele e sua família deixarem a cidade em direção às colinas, mas Ló, suas duas filhas e sua esposa fugiram para se salvar do desastre até uma pequena

cidade vizinha. Foi então que o próprio Deus castigara os homens perversos daquele lugar com uma lançante de fogo e enxofre, destruindo as famosas cidades de Sodoma e Gomorra.

A história acima, explica sob a perspectiva judaico-cristã, através do velho testamento, como duas cidades da margem do mar morto, no vale do Sidím, onde hoje encontra-se o Iraque, foram tragadas pelo fogo em um evento catastrófico nos idos de 1700 a.c.

Hoje, com os recursos científicos e tecnológicos que dispomos, pesquisadores da Universidade Trinity Southwest, instituição cristã que fica em Albuquerque, Novo México (EUA), acreditam que o evento que dizimou as duas cidades e suas populações foi causado pela explosão de um meteorito que atingiu a atmosfera terrestre. A explosão desses corpos celestes a poucos metros da superfície ocasionou o que observamos nas escrituras sagradas, a “chuva de fogo e enxofre”.

Os cientistas usaram carbono 14 para datar o evento nos restos de construção que sobrou do sinistro, foram feitas escavações na região onde existiam as cidades, não apenas de Sodoma e Gomorra, mas a de el-Hammam, e todas as demais nas proximidades.

Uma grande onda do Mar Morto também é provável que tenha inundado a região após o fogo ter tomado conta do lugar, fazendo com que a localidade tenha ficado com solo pobre para a agricultura e inabitável pelos próximos 700 anos.

Os cientistas ainda hoje tentam desvendar mais mistérios da época, analisando os restos e fundações que restaram das construções do período.

Durante muito tempo se imaginou que as cidades nem tivessem existido e que o conto bíblico não passasse de uma história contada para justificar o castigo nas sociedades antigas e modernas.

Na antiguidade, a religião, através dos mitos era a forma de conhecimento que existia e que explicava todos os fenômenos, inclusive muitos que hoje já foram elucidados.

O mito de que “se você fizer algo errado será castigado” ainda perdura mesmo após o advento da ciência e mesmo tendo passado mais de 3 mil anos desde as primeiras escrituras. O medo de sofrer, de ser penalizado e expiado caminha lado a lado com a humanidade. Para muitos, a passagem terrena é um julgamento para a morada eterna, o paraíso ou para o inferno.

Independente dos recursos científicos ou da análise filosófica, o mito vai ser sempre uma constante na vida humana. Eventos nunca explicados e que talvez nunca sejam explicados pela impossibilidade da experiência vivenciada (como a morte, por exemplo) sempre irão contar com uma gama de hipóteses baseadas na ciência, na filosofia, nas religiões ou na mitologia.

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