Categoria: Alcinéa
De quando os vizinhos eram os parentes mais próximos
Naquele tempo vizinhança era uma grande família. Falava-se que o vizinho era o parente mais próximo. E isso fazia muito sentido, pois qualquer sufoco – não importava a hora – recorria-se primeiramente ao vizinho.
Uma dor à noite? Corre lá no vizinho pra ver se ele tem um analgésico ou um chazinho.
Acabou o açúcar na hora de fazer o café? Ninguém ia tomar café amargo. “Menino, pega uma xícara e vai lá na vizinha pedir emprestado um pouco de açúcar”.
Ia viajar e era dificil pegar taxi? (Naquele tempo se chamava carro de praça). O vizinho que tinha carro se prontificava a levar o viajante ao aeroporto.
Ia sair e não ficaria ninguém casa? Era só deixar a chave na casa do vizinho que o primeiro que chegasse ia lá pegar.
E aniversário de vizinho hein? Todo mundo queria ajudar a fazer a festa. Uma vizinha fazia o bolo, outra oferecia o vatapá, outra fazia o risoto e outras se ofereciam para moer a maniva da maniçoba… os homens ajudavam a botar a cerveja pra gelar naqueles enormes barris com imensas pedras de gelo e moinha. A moinha que um já tinha ido buscar na véspera numa serralheria.
Quando chegava um novo vizinho ele tratava logo de se apresentar indo de casa e falando: “Sou fulano de tal, estou me mudando hoje pra cá com minha família, trabalho nisso e naquilo e estou me colocando às ordens.”
A vizinhança mandava logo um bolo, ou qualquer outra guloseima, para os “novos parentes” como manifestação de boas vindas.
Era o tempo de cadeiras na calçada (não havia assaltantes) em animadas rodas de conversa enquanto as crianças brincavam de bombaqueiro, caí no poço, bandeirinha, tome esse anelzinho não diga nada a ninguém, esconde-esconde…
Todo mundo se conhecia, se gostava, se ajudava, repartia os frutos dos quintais.
Hoje praticamente os vizinhos não se conhecem, sequer se cumprimentam.
Lembrei disso porque ainda tenho alguns vizinhos “parentes mais próximos”. Ontem mesmo, minha vizinha Josy – que tem coqueiros em seu quintal – bateu à minha porta com um cacho de côco. “Côco do Chicola, vizinha”. E tem também o Janjão que volta e meia me traz sapotilhas do seu quintal ou uma porção de cação cozido feito por ele.
(Alcinéa Cavalcante)
Já que hoje é Dia do Amigo vamos de poema para os amigos
Vida de jornalista
Não lembro exatamente os anos, mas foi na segunda metade da década de 1980.
Eu, Alcinéa Cavalcante, entrevistando o governador do Território Federal do Amapá, Jorge Nova da Costa.
Nova da Costa governou o Amapá de julho de 1985 a abril de 1990. Foi nomeado pelo então presidente José Sarney. Na época não havia eleição para governador.
Mas antes disso, lá pela década de 1950, Nova da Costa morou alguns anos no Amapá exercendo cargo na Divisão de Produção (o que corresponde a Secretaria de Agricultura. Na época não existiam secretarias).
Te prometo
Entardecer
Te prometo, Poeta,
que no próximo entardecer
vou pintar um arco-íris
para deixar tua tardezinha
menos triste.
Hás de sentir que o entardecer
pode ser tão belo
quanto o alvorecer
que ilumina teu rosto
e abre sorrisos no teu olhar.
Presta atenção, Poeta,
o entardecer
é o momento solene
no qual Deus apaga o sol
para acender a lua e as estrelas
Principalmente aquela estrela
que tanto te encanta
quando estás
tecendo sonhos
e versos na madrugada.
(Alcinéa Cavalcante)
A Lua agora no meu quintal. E um poema
Em noite de lua cheia
(Alcinéa Cavalcante)
Vamos namorar na praça, meu bem,
aproveitando este luar
que se derrama sobre a cidade.
Abraçados contaremos histórias
do espaço sideral
e embarcaremos numa nave brilhante
que nos espera no centro da praça.
Trocaremos juras de amor entre as estrelas
E lá do alto veremos a Terra
como um imenso bolo
confeitado com anelina azul-ternura.
Vamos namorar na praça, meu bem,
e embarcar na nave brilhante
que pousará na Lua
onde com um lápis mágico faremos um desenho.
Já pensou, meu bem, na surpresa dos astronautas
quando virem na lua
um coração com nossos nomes dentro?(Fotos: Alcinéa Cavalcante)
O Fim do Mundo
O Fim do Mundo
Quando disseram
que o mundo ia acabar
Tia Lila pegou seu terço
e pôs-se a rezar.
O dono da venda
dividiu toda a mercadoria
com seus funcionários
e distribuiu o dinheiro do caixa
para os mendigos.
A recatada dona Clotilde
jogou-se aos pés do marido
e implorando perdão
confessou que o tinha traído com o compadre.
Seu Joaquim, um santo homem,
ajoelhou-se no meio da rua
ergueu as mãos para o céu
e pediu perdão a Deus
pelos assassinatos que cometeu
como matador de aluguel.
No dia seguinte
o dono da venda pedia esmolas,
a recatada Clotilde, expulsa de casa,
foi morar num velho puteiro,
Seu Joaquim foi preso.
Só Tia Lila continuou do mesmo jeito.
De terço na mão continuou rezando
e entre uma oração e outra murmurava:
– É mesmo o fim do mundo
– Dona Clotilde, hein, quem diria?
– Seu Joaquim com aquela cara de santo, hein!
É o fim do mundo! É o fim do mundo!
(Alcinéa Cavalcante)
Bilhetinho
Bilhetinho
Meu caro:
recebi tuas bem traçadas linhas.
Tua caligrafia é muito linda.
Porém, confesso, o que mais me encantou
foi o selo colado
no envelope “par avion”.
Arranquei-o com cuidado.
Ele agora faz parte da minha coleção.
Tua missiva eu guardei
naquela caixinha cor-de-rosa.
Prometo responder
assim que tiver um tempinho.
(Alcinéa Cavalcante)
Procura
Procura
Eu estava lá quando o sol
jogou sorrisos dourados no rio-mar.
Eu ainda estava lá
quando uma estrela riscou o céu
e um pescador apanhou uma estrela do mar.
Por testemunha tenho um bem-te-vi
que bem me viu
quando as andorinhas bailavam no ar.
Quis fundir ouro com prata,
estrela cadente com estrela do mar
e cantar um canto novo
para sair bailando contigo.
Mas
tu não estavas lá.
(Alcinéa Cavalcante)