Um poema de Annie de Carvalho

O Buriti
Annie de Carvalho

Um buriti embalava-se em meus sonhos,
trazia o vento da rosa dos ventos
depois ia pôr-se com o sol do solstício de verão.

O Buriti vinha sombrear meus anseios
e seu fruto salivava em minha boca.
Seu fruto do ventre da árvore gigante.

Venho da raiz desassosegada,
da planta que sombreia o mundo
E se transforma em revoada…

Buriti fazedor das fantasias
tuas mãos nativas libertam
e tatuam epifanias…

Buriti tatuador da poesia!
Cria horizontes escarlates
com as tintas dos paradigmas.

Sou tua nova semente;
fecunda-me… toda
a substância dos teus enigmas.

(Da coletânea “Poemas, poesias e outras rimas” que será lançada em fevereiro em Macapá)

Noturno

Noturno
De noite eu vigio estrelas.
Embriago-me de amor e luar.
Passeio com Hemingway em Paris.
Visito os becos de Goiás com Cora Coralina.
E com Quintana eu tento descobrir
o que é que os grilos
passam a noite inteirinha fritando.

Dormir é bom de manhãzinha
quando o sol
– ainda sonolento e tímido –
pula minha janela para me ninar.
(Alcinéa Cavalcante)

Um poema de Manoel Bispo

Timidez
Manoel Bispo Corrêa

Existe a tua formosura
Enclausurada no riso timidez
De flor de lis, de flor lilás
De flor de luz nascente.

Existe a porta do céu aberta
E o teu coração morrendo à míngua
Existe uma declaração de amor eterno
Na ponta da minha língua.

Um poema de Aluízio Cunha

Os olhos da menina
Aluízio Cunha

Olho os olhos tristes da menina
que perdeu a mãe
que foi ser estrela
que foi ser lua
areia sideral
fragmento de sol.

Olho os olhos da água
querendo sufocar as praias
alagar o mundo
inundar o globo
afogar o universo
querendo deslumbrar-se em Deus.

Olho os teus olhos
bem profundamente, menina,
e surpreendo
doce amor
amarga saudade.

Chá da tarde

Pássaros
Jaci Rocha

Pássaros formam ninhos

E voam!

E cantam quando descansam

– Será que eles amam?…

Pessoas formam voos

E ninhos

E cantam quando amam

– Será que descansam?

O elegante movimento do universo

Não responde o labirinto

Apenas do que é feito a matéria

Que o formou…

Aquele canto que o passarinho entoou

Não tinha um adeus, nem até breve

O vento que sopra suas asas

É mais leve…

Chá da tarde

A Rosa
Maria Helena Amoras

Na escuridão do tempo
eu vi a rosa passageira
era muito mais bela
que a rainha do amanhecer.

Entre o mistério da noite
estava exposta e descoberta
uma visão estranha do lilás
que aos meus olhos desperta.

Não sei a cor, mas era linda.
Se era branca ou vermelha,
violeta, azul ou cinza
nada igual se assemelha.