Osmar Junior

Remendando palavras
Luiz Jorge Ferreira
Filho não se prometa limpar as coisas que espalhei pela casa
Nem amarre as noites lá fora… para que percam a hora de lustrar as estrelas que enferrujam sobre as gaiolas
Não derrube as gavetas no chão, pode misturar as palavras, e palavras misturadas não soam bem.
Há de se atentar com a cicatriz de passos quando correr a vassoura sobre o chão
Deixei muitas caminhadas desenhadas rumo ao horizonte e nunca fui…
São gestos inúteis desenhados sobre as costas do gato de pelúcia
São apostas de um jogo de astúcia com o olhar penetrante dos cães.
Filho respeite os vasos, as flores e as folhas secas, essas são as que mais representam a efusão da vida e se abrigam da vida na morte.
Leia os cadernos, sim os cadernos de folhas soltas partidas, de reconstrução de proparoxítonas, da inclusão suave do til, do desespero do não, e da perplexidade do sim.
Quando for rasgá-lo se for canhoto, troque de mão, as letras choram sob uma pressão muito forte, as suavidades são muito desejadas por elas.
E essa velha casa, a respeite sob suas pisadas… há de lembrar…
Que ela me acolheu com um ventre, que um dia acolherá você.
Escancare as janelas, acenda todas as lâmpadas, molhe todas as plantas, ponha minha fotografia a porta da rua, e espalhe boas novas mesmo que a solidão seja a única expectadora…
Pode ser que a saudade apareça vestida como uma colegial…
Pode ser… pode não ser…
De fato os dias estranhos estão ficando banais.
Hoje a manhã foi repleta de lirismo e poesia na Justiça Federal no Amapá.
O Movimento Poesia na Boca da Noite estendeu lá o Pano da Poesia e encantou estudantes, autoridades e servidores com belíssimas declamações de autoria de poetas amapaenses.
Foi um momento mágico.
Além das declamações, teve varal de poesias, sorteio de livros de autores amapaenses e distribuição de chocolates com trechos de poemas.
O Movimento Poesia na Boca da Noite agradece o convite feito pela Justiça Federal, a forma como foi tratado e como tudo foi muito bem organizado e se coloca à disposição sempre que a Justiça Federal quiser e puder repetir estes momentos.
O primeiro livro solo do escritor Tiago Quingosta, Aluvional é a segunda obra da Trilogia das Águas, em que são abordadas temáticas relacionadas às experiências de vida do autor na Amazônia, cuja voz é a manifestação identitária de um homem do norte.
Durante seis capítulos e 60 poemas – entre os quais está Imersio, seu trabalho audiovisual, disponível no Youtube – ele percorre seu amadurecimento enquanto escritor e artista, apresentando versos de um homem forte e condizentes com suas dores e realidades.
Aluvional traz a poesia amazônica na sua ambientação e utilização das palavras para descrever o que sente, para fazer o leitor mergulhar nas águas do maior rio em volume de água do mundo, o rio Amazonas, aborda uma jornada poética em meio à maior floresta tropical do mundo.
O lançamento será sábado, às 16h no Mercado Central.
(Ascom)
TELA
Aluízio Botelho da Cunha
O pincel fixou sombras escuras
nas sobrancelhas da moça
e deu um tom de tardes prematuras
nos olhos claros
da clara judia.
(Também já esbocei olhos e sóis,
subjugando curvas
sobre rosto oblíquo)
Dei traços de luz
em cabelos cor de noite,
e auroras nasceram
do sol ardendo,
houvesse, embora,
eclipse solar.
Se eu modelar, um dia,
novas dimensões da tua presença,
atrairá teu corpo
a lei da gravidade dos sentidos.
(Extraído da antologia Modernos Poetas do Amapa – Macapá-AP, 1960)
Marcas de amor
Neth Brazão
Mergulho no profundo silêncio
Em queda livre me deixo ir
Levemente a brisa sussurra
Versos indecifráveis
Doces, os quero ouvir…
Ouço um anjo cantando para mim
Penso em você
Penso no beijo que ficou por acontecer
Penso e, me deixo ir
Sigo em viagem solo
Com muito de ti aqui
Desejo que sintas
A mesma saudade que me consome
Quem sabe voltas ao teu lugar
Onde sou toda feita de você
Sou para você
Em um universo solitário
Em um querer sem fim
… Ah! Eu sou tão bonita
Para ficar com a solidão
INFÂNCIA
Raquel Braga
Quando eu era pequenina
No início do entendimento
Sonhava ser bailarina
E dançar sem pensar no tempo.
E o tempo passou tão depressa
Que transformou completamente
A menina dos meus sonhos, tão liberta
Na mulher que hoje vês na tua frente.
Mas, embora este corpo não aparente
Minha alma continua uma criança
Que te vê ao lado meu, eternamente,
Na vontade de esvair-se numa dança.