Um poema de Paulo Leminski

Razão de ser
Paulo Leminski

Escrevo. E pronto.
Escrevo porque preciso,
preciso porque estou tonto.
Ninguém tem nada com isso.
Escrevo porque amanhece,
E as estrelas lá no céu
Lembram letras no papel,
Quando o poema me anoitece.
A aranha tece teias.
O peixe beija e morde o que vê.
Eu escrevo apenas.
Tem que ter por quê?

(Do  livro ‘Melhores Poemas de Paulo Leminski’, organização de Fred Góes, editora Global)

Um poema de Natal

Natal
Alcy Araújo (1924-1989)

Que cada um
leve um pássaro
para a amada.
Quem possuir anjo
leve também
seu anjo.

É Natal

Deus acende
pássaros
e rosas
e estrelas
que tentam
inutilmente
fazer renascer
a cor branca
enodoada
pelo vento
que vem das usinas
nucleares.

Despedida – Ferreira Gullar

Eu deixarei o mundo com fúria.
Não importa o que aparentemente aconteça,
se docemente me retiro.

De fato
nesse momento
estarão de mim se arrebentando
raízes tão fundas
quanto estes céus brasileiros.
Num alarido de gente e ventania
olhos que amei
rostos amigos tardes e verões vividos
estarão gritando a meus ouvidos
para que eu fique
para que eu fique.

Não chorarei.
Não há soluço maior que despedir-se da vida.

(Extraído do livro “Barulhos”, que reúne a produção poética de Ferreira Gullar entre 1980 e 1987)

Sem mandamentos

Sem Mandamentos
(Osvaldo Montenegro)

Hoje eu quero a rua cheia de sorrisos francos
de rostos serenos, de palavras soltas,
eu quero a rua toda parecendo louca
com gente gritando e se abraçando ao sol.
Hoje eu quero ver a bola da criança livre
quero ver os sonhos todos nas janelas
quero ver vocês andando por aí.
Hoje eu vou pedir desculpas pelo que eu não disse
eu até desculpo o que você falou
eu quero ver meu coração no seu sorriso
e no olho da tarde a primeira luz.
Hoje eu quero que os boêmios gritem bem mais alto
eu quero um carnaval no engarrafamento
e que dez mil estrelas vão riscando o céu
buscando a sua casa no amanhecer.
Hoje eu vou fazer barulho pela madrugada
rasgar a noite escura como um lampião
eu vou fazer serenata na sua calçada
eu vou fazer misérias no seu coração.
Hoje eu quero que os poetas dancem pela rua
para escrever a música sem pretensão
eu quero que as buzinas toquem flauta doce
e que triunfe a força da imaginação.

Poeminha em noite de superlua

Poeminha em noite de super lua

Vamos namorar na praça, meu bem,
aproveitando este luar que se derrama sobre a cidade.
Abraçados contaremos história do espaço sideral
e embarcaremos numa nave brilhante
que nos espera no centro da praça.

Trocaremos juras de amor entre as estrelas
E lá do alto veremos a Terra
como um imenso bolo confeitado com anelina azul-ternura.

Vamos namorar na praça, meu bem,
e embarcar na nave brilhante
que pousará na superlua
onde com um lápis mágico faremos um desenho.

Já pensou, meu bem, na surpresa dos astronautas
quando virem na lua um coração com nossos nomes dentro?

(Alcinéa Cavalcante)

Via Láctea – Olavo Bilac

Via Láctea
(Olavo Bilac)

“Ora (direis) ouvir estrelas! Certo
Perdeste o senso!” E eu vos direi, no entanto,
Que, para ouvi-las, muita vez desperto
E abro as janelas, pálido de espanto…

E conversamos toda a noite, enquanto
A Via Láctea, como um pálio aberto,
Cintila. E, ao vir do sol, saudoso e em pranto,
Inda as procuro pelo céu deserto.

Direis agora: “Tresloucado amigo!
Que conversas com elas? Que sentido
Tem o que dizem, quando estão contigo?”

E eu vos direi: “Amai para entendê-las!
Pois só quem ama pode ter ouvido
Capaz de ouvir e de entender estrelas.”

Hoje é o Dia Estadual da Poesia

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Instituído pela Lei N. 580, de 21/06/2000, 8 de agosto é o Dia Estadual da Poesia. A data foi escolhida em homenagem ao poeta, médico, professor e ex-prefeito de Macapá Alexandre Vaz Tavares, nascido em Macapá no dia 8 de agosto de 1858. Consta que ele foi o primeiro  a escrever poemas sobre Macapá. Sua poesia “Macapá” (praticamente desconhecida das novas gerações) foi publicada pela primeira vez em agosto de 1889, na Revista de Educação e Ensino do Pará. Vaz Tavares morreu em abril de 1926, aos 67 anos.

Vale ressaltar que a iniciativa de  instituir o Dia Estadual da Poesia partiu dos poetas José Pastana, Ricardo Pontes e Leão Zagury. Eles fizeram a minuta de  um projeto de lei e apresentaram ao então deputado Edinho Duarte, que abraçou a causa, fez o projeto e apresentou na ALAP, sendo aprovado por unanimidade.

O Movimento Poesia na Boca da Noite e a Associação Literária do Estado do Amapá (Alieap) vão comemorar o Dia Estadual da Poesia   sábado que vem , das 9h às 11h na Praça Veiga Cabral, com café da manhã, distribuição de brindes poéticos, varal de poesia, venda de livros, sessão de autógrafos, leitura e declamação de poemas de autores amapaenses, entre eles “Macapá” de Vaz Tavares.

Você, leitor do blog, é nosso convidado especial. Leve sua poesia ou de seus poetas preferidos para ler, declamar ou enriquecer o varal.
Todos estão convidados. E nem precisa ser poeta para participar deste momento mágico, basta gostar de poesia.
Então está combinado: nos encontraremos sábado, a partir das 9h, na Praça Veiga Cabral.

Veja aqui como foi linda, emocionante e inesquecível a comemoração ano passado. E este ano vai ser melhor ainda.

(Se precisar de mais informações entre em contato com a ALIEAP ou com os membros do Poesia na Boca da Noite, ou use a caixinha de comentários deste blog ou pelo email [email protected] )

Noturno

De noite
eu vigio estrelas.
Me embriago de amor e luar.
Passeio com Hemingway em Paris.
Visito os becos de Goiás com Cora Coralina.
E com Quintana eu tento descobrir
o que é que os grilos
passam a noite inteirinha fritando.

Dormir
é bom de manhãzinha
quando o sol
– ainda sonolento e tímido –
pula minha janela
pra me ninar.

(Alcinéa Cavalcante)

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Um poema para os amigos

 

Poema para o Amigo
Alcinéa Cavalcante

É possível que eu te conte
uma história de príncipes e fadas
que escutarás com o olhar perdido na infância.
Ou que te conte uma piada tão engraçada
que rolaremos de tanto rir.
Nossas gargalhadas contagiarão os passantes
e de repente todo mundo estará rindo
sem nem saber por que.

É possível
que eu faça um café com tapioca e te chame
pois café, tapioca e amigo tem tudo a ver.

É possível que eu chegue na tua casa sem avisar
só pra te ofertar uma rosa que acabara de nascer
e te oferecer um Johrei.

É possível que eu te ofereça uma música no rádio
ou te mande, pelo Correio,
uma carta numa folha de papel almaço.

É possível que eu te ligue
no meio da noite
no meio do dia
a qualquer hora
– mesmo na mais imprópria –
só pra dizer:
Amigo, eu amo você.

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