Macapá era assim

Praça Veiga Cabral 2A foto é dos anos 70.  Ainda não havia o Teatro das Bacabeiras. O relógio instalado na calçada não marcava apenas as horas, mas sim o tempo de  encontro entre amigos, colegas e namorados na Praça Veiga Cabral.
Lembras?

Quem andou no “caixa de cebola”?

Este é o primeiro ônibus que circulou em Macapá. Era chamado “Caixa de Cebola”. Você andou nele? Seus pais andaram? Conhece alguém que andou nele? Conta aí na caixinha de comentários e se souber conta também porque ele era chamado de “Caixa de Cebola”

Lembras?

O velho Trapiche Eliezer Levy, de muitas histórias, causos e lendas. Nele atracavam embarcações de bandeiras de vários países e os gringos aproveitavam para tomar um sorvete, servido em taça de inox pelo famoso garçom Inácio, no Macapá Hotel.

Era desse trapiche que saiam os navios com destino a Belém. No final das férias iam lotados de universitários que voltavam para as faculdades (não havia ensino superior no Amapá).

Nas tardes de domingo o velho trapiche era a passarela da juventude. Depois da sessão da tarde nos cines João XXIII e Macapá os jovens iam como em procissão passear ali. Era um passeio obrigatório.

À noite era comum ver na ponta do trapiche um pescador solitário. Um pescador de peixes, ou de estrelas, ou de poesia ou de raios da lua.

A foto é do tempo em que ainda existia a tão cantada em verso e prosa “Pedra do Guindaste” de muitas lendas. Uns diziam que meia noite a pedra transformava-se num navio de ouro maciço enfeitado com diamantes e esmeraldas. Outros contavam que era uma princesa encantada e tinha gente que jurava ter visto “com esses olhos que a terra há de comer” a pedra se transformar em princesa quando o relógio marcava meia-noite.

Um dia colocaram a imagem de São José, padroeiro de Macapá, em cima da pedra. Pouco tempo depois um navio chocou-se com ela e praticamente nada restou dela. No lugar foi construído um pedestal de concreto para São José.
O santo padroeiro fica de costas para a cidade, mas abençoando todos que aqui chegam pelo majestoso rio Amazonas.

Macapá ontem e hoje

Lembras quando a gente andava por esta ruazinha nas tardes de domingo?

Depois de assistir a segunda sessão no Cine João XXIII, a turma rumava para a frente da cidade – passando pela avenida Mário Cruz – para passear no trapiche e depois tomar sorvete, servido em taça pelo famoso garçom Inácio, no Macapá Hotel.

Domingo sem cinema, passeio no trapiche e sorvete, não era domingo.

Já não existem o Cine João XXIII e a sorveteria do Macapá Hotel com mesas ao ar livre.

O bom e velho Inácio, contador de causos e histórias, que servia com a mesma elegância e simpatia tanto o peão como os presidentes da República e ministros que visitaram Macapá naquela época hoje conta causos no céu.

Macapá 254 anos – O aeroporto era na FAB

Avenida Fab domingo à tarde

Essa avenida larga, movimentada, tida como a principal de Macapá, por onde passam todos os ônibus e onde ficam escolas, secretarias de governo, hospitais, tribunais, Assembléia Legislativa, Câmara de Vereadores e Prefeitura, foi o primeiro campo de aviação de Macapá. Por isso quando virou avenida recebeu o nome de Avenida FAB (Força Aérea Brasileira). Aí  pousavam todos os aviões que chegavam em Macapá e daí decolavam.

Aeronave  C47 da Cruzeiro do Sul

O José Ribamar Pessoa trabalhou neste aeroporto da avenida Fab. Ele contou ao blog que não havia cerca, muro, nada que impedisse que as pessoas chegassem bem pertinho do avião para receber quem estava chegando ou se despedir de quem estava partindo. “Sobre a multidão que aparece nessa foto informo que naquela época, era permitido a todos receber autoridades, familiares, etc embaixo da aeronave, inclusive também no embarque”, conta.

O poeta Manoel Bispo – que chegou gitinho em Macapá – conta que  quando a molecada ouvia o barulho do avião corria pro “aeroporto” vislumbrando ganhar uma grana pra comprar gibis, picolés e garantir o da matinê do cinema.
É que naquela época não existia táxi em Macapá e quase nenhum carro particular (ônibus nem pensar). A pessoa chegava, descia do avião e ia a pé pra casa. É aí que a molecada entrava. Se aproximava do passageiro e oferecia o serviço: carregar a maleta, do aeroporto até a casa. “O ‘carreto’ mais longo que fiz com uma mala na cabeça foi do aeroporto pro bairro do Trem. A maleta era daquelas de madeira, mas me rendeu um bom dinheirinho, me disse o poeta certa tarde.

Dia desses o Celso Façanha estava lembrando dos seus tempos de moleque e disse que uma vez viu “com esses olhos que a terra há de comer” um avião quase entrar num prédio ali por perto de onde é hoje a Escola Integrada.
Deixemos o Celso contar:
Era um dia de chuva, a pista tava um lamaçal, o avião aterrissou mas não conseguiu parar logo. Foi indo, indo, indo…  e só conseguiu  parar ali perto do GM, quase que entra num prédio onde era o Irda. Quando a porta  abriu  o primeiro passageiro a descer foi o Pernambuco, um açougueiro brabo. Ele desceu reclamando: “Pô, esse cara (piloto) podia ter logo me deixado em casa.”

Minha mãe, a professora Delzuite Cavalcante, contava que, sentada no pátio da nossa casa, via os pousos e decolagens.
Era ali, dizia apontando com o dedo, o campo de aviação e daqui a gente via tudo.”
E minha avó completava: “o avião passava aqui na ilharga.”

 

Macapá 254 anos – Velha praça

Praça da Matriz em 1935  (hoje Veiga Cabral)

No coreto se apresentavam as bandas de música da Guarda Territorial e do Mestre Oscar. Foi ouvindo estas bandas que interpretavam de forma magistral clássicos da música que muitos casais começaram a namorar e casaram, aí pertinho do coreto mesmo, na bicentenária igreja de São José.

O poeta Arthur Nery Marinho – que veio para o Amapá em 1946 – chegou a tocar  no coreto e relembra a velha praça nesta poesia publicada no livro “Sermão de Mágoa”, em 1993.

Praça Antiga
Arthur Nery Marinho

Velha praça, velha praça,
tenho saudade de ti.
Não da bonita que estás
mas da que eu conheci.

A praça do tio Joãozinho
e do seu Naftali:
o primeiro era Picanço
e o segundo Bemerguy.

A praça do João Arthur
também a praça do Abraão,
a praça que outrora foi
da cidade o coração.
A praça em que se jogava
todo dia o futebol,
esporte que só parava
quando já dormia o Sol.

Parece que isto foi ontem,
mas tanto tempo passou,
o que deixou de existir
minha saudade gravou.
Vejo a barraca da Santa,
vejo ali o ABC.
Há muito tempo não existem
mas a minha saudade os vê.

Da igreja o velho coreto
eu avisto, neste ensejo.
Do mestre Oscar vejo a banda
e lá na banda eu me vejo.

Eu considero um castigo
não apagar da lembrança
o que me foi alegria
e agora é desesperança.

Velha praça, velha praça,
renovaste e linda estás.
Não tens, porém, a poesia
do que ficou para trás.

Crônica do Sapiranga

CHOREI,  E MUITO !
Milton Sapiranga Barbosa

Depois que os  desfiles cívicos, pátrios  e carnavalescos foram transferidos  da Av. FAB para à  avenida Ivaldo Veras(Sambódromo), nunca mais  me  interessei em  ir  assistir  desfiles no  local acima  mencionado,  até que  neste  ano de  2011, não  pude  deixar de ir, por  dois motivos  que  julguei importantíssimos,  como  vocês  poderão  comprovar a  seguir.

Minha   filha  caçula, Elinne, quando  fui  visitá-la  no  sábado, 03/09,  me  fez um  convite muito  especial, pedindo  que  fosse assistir o desfile  do Pedro Caíque, seu  filho(  aquele moleque da crônica O filho da lavadeira e o neto indagador ). Lembram? De  imediato  prometi  que não ia  faltar. Primeiro, porque  naquele dia em  que ele  desfilaria, eu  estaria  de berço, completando 66 anos  de  vida,  e segundo, por que, sem dúvida,  veria  naquele  moleque, da terceira geração da Dona Alzira, um  pouco  de mim, já que  ele  carrega nas veias um de meu sangue. Não,  eu poderia  deixar  de  ver meu Neto desfilar  pela  primeira  vez  na  vida  e logo no dia  de meu  aniversário.

Na  quarta  feira, 07/09, às  06  da manhã  já  estava acordado. Depois  de rezar  e agradecer à Deus por  me  dar, até  então,  o  dobro  de   sua  idade,   tomei um reconfortante banho, vesti  uma  roupa  nos  trinques, bebi o café matinal , saindo  em seguida  pedalando  minha  bike   rumo  ao  sambódromo.
Como   o trajeto da casa  onde moro  até ao local do  desfile dista uns  mil  e quinhentos  metros aproximadamente, ou mais,  fui  relembrando, feliz,  como  pinto no lixo, dos  meus  tempos  de jardim de infância  até à  quinta  série, iniciado no  anexo  da Escola  Normal  e concluído  no Grupo Escolar Barão do Rio Branco.
Lembrei das  professoras  que  me  deram ensinamentos  e  alguns  cascudos, também. Como  foram diversas, não  cito nomes para não cometer injustiça.
Lembrei  com saudade da  “Turma  da Graxa”, pois  por  dois  anos, por  ser baixo  e magrinho, sempre ficava no  pelotão da “bagunça”,   já  que   na graxa não havia preocupação  com  o passo  certo. Bem  que tentávamos,  dando  aquele “pulinho”  para  acertar o  passo(assim pensávamos), com o  do  colega  que marchava ao lado  direito ou  na frente, mas as  vezes eles  também estavam marchando errado, e a coisa  ia  do jeito que  dava até o final  do desfile da escola.Mas o orgulho de  passar  em frente ao Palanque  Oficial era indescritível.
Recordei  da Turma do Bastão , da  Escola  Industrial,   comandada  pelo  saudoso professor, árbitro, atleta e  escoteiro, Expedito da  Cunha Ferro(91), que   com uma  varinha na mão direita, exigia muita  atenção  e disciplina  dos  “bonecos  de anil” por  ele  selecionados .
Quando a Turma do Bastão parava  em  frente  ao  palanque  e  começava a fazer  evoluções, com uma  precisão incrível, era  um  espetáculo  e os  aplausos  e  fogos  eram  ensurdecedores.

De  repente, ainda envolto nessas  gostosas  lembranças de  meu  tempo de primário, cheguei  na Ivaldo Veras, acho  que uns  10  minutos  antes de começar  o  desfile de  7  de setembro. As  dependências  do  sambódromo já  estavam lotadas. E  agora? Como  iria ver meu  neto passar garboso pela  avenida. Felizmente, liberado por  uma  policial  militar, consegui lugar  em uma  das  cabines  que  abrigam os  jurados nos   desfiles carnavalescos. Lá, daquele  lugar privilegiado, fiquei  atendo, assistindo  o passar dos membros da Polícia Militar, um pelotão da Legião Estrangeira, e  os  alunos das diversas  escolas  de Macapá  e  dos  meus  olhos   começaram a  cair  gotas e mais  gotas  de lágrimas .
Como  tinha  gente  ao  redor, de vez  enquanto  eu ia  até  a escada enxugar lágrimas  saudosas  que  teimavam em cair devido a forte emoção que  tocava meu  coração, por  lembrar da minha  infância  feliz.
De  repente,   lá  vem o  pelotão da Polícia Ambiental e dentro  de um carro  patrulha,  envergando  o  uniforme da  companhia, no posto  de  Tenente, era  meu  netinho Pedro Caíque  Barbosa Baía.
Outra  vez  voltei no  tempo. Ao  vê-lo,  comodamente sentado naquela   viatura, foi  então  que  chorei pra valer,  ao lembrar,  do  dia  em que  cheguei  atrasado para receber o  material que  o governador Janary Nunes mandava  distribuir para os alunos da época (macacão   e botas). Quando  chegou a minha vez, o macacão  estava na medida  certa, mas as botas estavam  dois números acima  do que   eu  calçava, 38 em vez  de  36. Mas  quem disse  que  recusei? Eu não  ficaria sem  desfilar  de forma alguma.
No  dia  7, bem cedo, coloquei uns  pedaços  de  papéis nos  bicos  das botas,  calcei duas meias  de  jogador  do  meu  cunhado justo (grande  zagueiro  do Amapá Clube) e mais  a meia da  escola e  fui  todo  contente  para  a avenida  FAB.
Minha  escola Barão do Rio Branco, foi a  quarta  a desfilar, pegando já um  forte  sol  pela  frente. Quando passamos  em frente  ao palanque, ao  olhar  pra  direita, avistei  minha  mãe Alzira e minha irmã Mariazinha batendo  palmas e ostentando largos  sorrisos  em  seus  rostos.
Elas, eu tinha  certeza,  estavam aplaudindo orgulhosas   aquele  moleque  magrela, que  mesmo  com enorme  sacrifício  de  marchar   com  aquelas  enormes botas  e  com pesos  extras, passava  garboso  diante  do  público e  das  autoridades, como se  tudo  estivesse  normal.

Terminado o  desfile, fui liberado para  ir  tomar  banho na  praia  da  Fortaleza de São José, que naquele  tempo  era  bem limpinha  e tinha muita  areia. Tirei  as botas  longe  dos  colegas, tomei  banho  e  depois trouxe as botas  nas mãos, pois  se eles vissem o tanto  de papel e pano que havia  utilizado no calçado para poder  desfilar, era  gozação  por  toda a  vida. É, chorei de verdade, ainda mais que  depois  que  meu  neto  desfilou, correu  ao meu  encontro,  me  deu  um   forte  abraço  de parabéns  pelo  meu  aniversário,  depois    que lhe  prestei  continência. Afinal  estava  diante  de um Tenente Mirim da Polícia Ambiental. CHOREI,  SIM !  E VOCE, NÃO  CHORAVA?